sábado, 12 de maio de 2007

As leis da Injustiça e do Amor

Ao chegarmos à entrada de Cyborg Town, vimos que “O Cavalheiro” estava fechado para negócios, e isso notava-se à distância, pois existia, em vez do cartaz de néon que fora removido, um cartaz pequeno na ementa do menu na praça movimentada de três sentidos do metro: um era onde tínhamos saído, o outro dava para os Alpes das Sereias, e finalmente, o terceiro indicava a entrada para a Avenida Principal de Cyborg Town.
Tentei ler o que estava escrito na ementa, uma coisa super estranha que dizia:




Segundo a nova lei 456, parágrafo 14, alínhea c), aprovada por Sua Senhoria Suprema, a Grande Serpente, “Qualquer estabelecimento de nutrimentos e entretinemento público que tenha recebido a aprovação do Capitão Goldtheeth em cinco estrelas de classificação gastronómica, irá ser comprado pelo Estado apenas para fins do mesmo, e jamais cidadão algum deverá entrar em referido restaurante, discoteca, café, cinema ou galeria comercial sem uma permissão assinada por um “Fuinha” oficial da S.P.V.”
Pedimos as mais sinceras desculpas se lhe causámos algum incómodo.


Zelando pela sua segurança… ∫φф – Serpenteio da Polícia de Vigilância



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Comprada era o termo exacto para tal barbaridade! Ora que esta! Primeiro fazem todas as raparigas irem para a guerra para serem prostitutas dos homens da SPV, agora também querem fechar todos os lugares onde o povo arranja a comida e onde podem se divertir…?! Não compreendo mesmo o cérebro daquela mulher, a sério, se pudesse examinar a estrutura dos seus neurónios, existiriam uns parafusos que não estavam a funcionar lá muito bem. Ainda quero saber que raio o meu primo estará a pensar quando deixa algumas vezes a Madame ir dormir cá ao Château. Detesto-a, é claro que pode ter algum estilo, gosta de aranhas, adora sapatos de salto alto de cabedal altos vermelhos, tem quase os mesmos hobbies que eu, mas todos na Atlântida e na Família von Tifon concordam que ela é uma grande vaca oferecida e drogada, se o primo vê alguma coisa nela, que diga de uma vez por todas, não fique com ideias a olhar parado para ela como se fosse um gelado Magnum! Há uns dias vi um cartoon semi-pornográfico num jornal cyborg da Resistência com ela no papel de bruxa, semi-nua, com um soutien erótico e dançar a dança do ventre, com correntes presas puxadas por um nazi; um político americano; um mafioso italiano; um terrorista iraquiano; um ditador sul-americano; um militar comunista asíatico; muito exagerados nos seus traços típicos a darem-lhe dinheiro, jóias, armas, perfumes, e roupas caras por uma enormes tigela como se ela fosse uma cadelinha – na verdade, a Serpente de Fogo estava na forma de um poodle francês convencida, portanto, o seu voluptuoso e sensual corpo estava cobertos de pêlos de cadelinha horrorosa para não serem censurados (coisa que já estariam sujeitos ao publicar o jornal), e um balão a dizer: “Sou vossa escrava, dou-vos amor e a minha tecnologia, vós, meu Senhor, dai-me poder!”
Simplesmente escandaloso! É claro que ela não é assim tão provocadora, o tão mal dizente News Zone – O nome do jornal cyborg – exagera muito nas suas publicações, e para dizer a verdade, não sei se o misterioso editor e oficial da Resistência do Movimento das Forças Cyborgs também não será um pouco larilas ou xéxé…
Conclusão tiradas desta informação: se a nossa família não fizer nada
Também gostava de saber que tipo de homem lhe pôs a cabeça feita em papas, porque ela é simplesmente maluca: tem um feitio horrível e, tal como eu, arranha que se farta com aquelas unhas longas, grita como sei lá o quê, isto é, quando os homens da SPV não estão a fazer-lhe as vontades e não estão todos babados como marionetas sobre os seus fios. Mal me custa a pensar que aquela é a irmã gémea da boazinha e ingénua Sara…
Felizmente, eu conheço um certo “Fuinha” desprezível, que não me avisou desta bonita partida, suponho que seja para me proteger, não? Como é que gozarei a vida, se os palermas da SPV e os homens do primo estão sempre a dizer o que fazer?
Podem obrigar-me a estudar para ser uma conceituada espia na Guerra Civil, que jamais é apanhada, podem dizer que eu sou maluca, podem dizer que eu sou marota e oferecida, mas jamais tirararem-me as minhas discotecas, restaurantes e tardes no shopping, nem pensar!
E, lançando um olhar de desprezo sarcástico para o Chacal Amarelo, empurrei-o para o menu intencionalmente, esboçando um sorriso cínico.
- Diga-me mais, conte-me mais, meu caro Tenente Chacal Amarelo! – Exclamei num tom sádico a rir-me. – Foi obra sua, ou talvez gostaria de me ver a fazer figura de parva, apanhada na sua armadilha tão engraçada, teve tanta piada, a sério!
No chão, de cabisbaixo, tentou não olhar para mim, levantou-se, limpando a poeira, muito espantado e assustado pelos meus olhos azuis, ele pôs-se em sentido, e sorriu resignado com a sua séria situação.
- Não fui eu que promovi qual folia, Donna Jessica. – Respondeu ele inocentemente, com um sorriso frio. – Mas talvez fosse a La Traviata di la Grossa Serpente. É impossível, ela jamais aceitaria qualquer exigência dele…
Curiosa como sou, queria saber quem foi o desgraçado, achando-se vil o suficiente para forçar a sua amada a vender metade dos bens para conseguir dinheiro para comprar todos os locais públicos de Cyborg Town!
Se eu o apanhar, farei com que se arrependa seriamente de todas as infâmias que cometeu contra uma possível amiga.
Tinha de ser feita alguma coisa contra tal ignóbil ofensor de mulheres, expulsá-lo da vista de todos os feiticeiros bons. Mandá-lo para o “Limbo dos Espelhos”, uma espécie de Inferno e castigo para todos os bruxos malvados e horríveis, que só Deus sabe onde é. Ouvi dizer que é uma prisão de espelhos horrível, onde, ao longo dos séculos, um bruxo se vai decompondo, pedaço de carne por carne, osso por osso, órgão por órgão, poder por poder, até que este se torna nos vidros de mais um espelho, que servem para atormentar a fealdade atroz de mais um condenado à morte.
Sorrindo, simpaticamente, dei a mão ao Chacal Amarelo, e beijei-o amavelmente no rosto, com uns olhos que já não pareciam aqueles olhos crueis e frios que tinha. Uns olhos compreensíveis e bons.
- Iremos encontrá-lo, asseguro-lhe que este crime horrível não ficará na minha memória em vão. – Disse eu, indignada e com as mãos retorcidas, triste por haver tais vilões à solta nas ruas de Cyborg Town. – Agora é este o meu país, e vou defendê-lo custe o que custar de todos aqueles que quiserem violar os seus direitos, como aquele homem que violou os direitos da minha mãe, …
Contendo as lágrimas frias de ódio, imaginando o pior destino possível para aqueles bruxos malvados, sorri forçosamente, e não reparei que o Chacal Amarelo me perguntava alguma coisa:
- Então, donde está La Mamma Catarina? Tinha um ar sóbrio e sensível…
Não queria falar nisso, era um assunto demasiado triste para ser levado de ânimo leve, não, não naquela noite. Aquela noite era de alegria, não de reflexão, por isso não disse nem uma única palavra acerca disso.
Com um brilho de esperança nos olhos, virei as costas ao passado, e acelarei o passo, sem ligar o que deixava para trás. No entanto, porque snetia uma certa compaixão por aquele bruxo, porquê…? Tenho mesmo de esquecer aquele homem, eu e a Sara, eu, a Sara e a Serpente de Fogo temos de esquecer os males que nos atormentaram durante vários anos, sim…Esquecê-los para todo o sempre!
- Isso agora não interessa. – Respondi numa voz triste a soluçar, tentando esconder em vão os sentimentos. – Então…onde é o “Anel da Serpente”? Tenho a certeza que…
Compreendendo que eu começava a ficar com sono, o Chacal Amarelo ia abraçar-me e levando-me para casa. Primeiro porque estava a fazer-se tarde, segundo porque os italianos são muito sensíveis, e compreendem quando uma senhora sofre, ao contrário de certos bruxos idiotas e congelado!
Mal íamos voltar para a estação de metro, quando vimos o Pedro, passeando com os amigos na noite a ouvir uma música no leitor de mp3. Que bom, ele pode ser chato, mas ao menos poderia-me ajudar a animar-me, e talvez irmos todos juntos ao hotel, e curtimos música a séria, e não falar de estúpidos bruxos fantasmas, que sentem prazer ao torturar sete pobres raparigas, quebrar o seu coração sensível aos pedacinhos! Até elas já não terem mais nada na vida…Mais nada!
Reparando que estava a chorar, o Pedro correu logo em meu socorro, pensando que poderia ganhar a minha confiança se fingisse interessado no meu sofrimento.
E, pondo a sua cara mais inocente e preocupado de ursinho de peluche, abraçou-me descaradamente, como se eu fosse sua!
- Bebé, que se passa? – Perguntou ele numa voz curiosa.
Dei-lhe uma estalada na cara tão forte que ele até assobiou com uma marca vermelha muito forte no rosto lindo de tarado criançolas. Com um olhar frio respondi:
- Que te parece, grande estúpido? Um fascista nojento interesseiro qualquer obrigou a Serpente de Fogo a fechar todos os sítios mais porreiros de Cyborg Town! O único que está aberto é o piroso e feio edifício d’O Anel da Serpente!
Pobre Pedro, não sabe o quanto nós, mulheres e feiticeiras sofremos por causa dos bruxos, mas mesmo assim, era um raio de wesperança para me rir de vez em quando.
E, com a sua beleza humilde de latino moreno, olhou-me com os seus olhos castanhos, e vi que apesar de ser um pouco infantil, compreendia os nossos problemas então, deu uma segunda opurtinadade para eu falar com ele.
- Sabes, Jessica, tu és tu tão bonita, não devias desperdiçar esse corpo de deusa com bruxos velhos malvados e com os pénis enrugados e feios. – Disse ele num tom franco e sincero, mesmo preocupado comigo.
Dito isto, virou-me as costas, e, mesmo antes de se dirigir para outra rua, sorriu nesse jeito cómico e engraçado que ele só conseguia fazer.
- Vai para casa. Este não é um lugar para ti, aqui só haverá homens que te vão querer fazer mal, eu não quero que morras… - Disse ele num tom romântico, mas muito corado, envergonhado. À medida que falava, a sua voz tornava-se mais fraca, e apercebi-me que estava embraçado em dizer o que sentia. – Porque eu…Eu…É melhor eu ir andando. Tenente Chacal, com todo o respeito, conduza essa senhora à casa dela.
Acenou-me, muito vermelho, timidamente, e sorri resignada, esperando sempre pelo meu novo amigo.
Bom, também gosto de um amor jovem e tímido, na verdade, acho que é muito melhor do que um amor repentino e sensual, ou tão quente quanto o Sol.
Sim, agora me lembro, tive um amor assim: verdadeiro; secreto; ingénuo; sério; etéreo; é o amor mais bonito, deleite para o coração. Mas que acaba mais facilmente e que deixa feridas mais fatais, que nos acaba por matar, matando suavemente com o seu veneno, cada minuto sem o nosso amor parece um ano desperdiçado, sem ele não sabemos o que iremos fazer. Ai, o amor verdadeiro…!
O meu novo melhor amigo, que brinca com o amor, mas que sofre com ele, pobre e coitado jovem cyborg…
Cinco minutos depois, ele correu a dirigir-se para mim, encurralou-me num beco escuro, e beijou-me repentinamente, depositando os seus lábios firmes pequenos e secos metálicos nos meus molhados e sensuais grandes, e…Senti o prazer, o amor indiscreto, pois ele pôs a sua língua no interior da minha boca…! Decidi pôr-me os meus braços sobre o seu pescoço, e beijei-o com igual ou superior competência, afagando-lhe os cabelos pretos espetados, despenteando-o, nos melhores e espectaculares dez minutos da minha vida. Não sei…Será ele o homem da minha vida…? Ou apenas será o criançolas que parece, embora já tenha barba, e isso notou-se, no nosso beijo espantoso…!
Depois daquela cena, saímos do beco, e descobri que o Chacal Amarelo e os outros tinham ido embora! Bolas, como iríamos encontrar o caminho para casa…?
E era tudo culpa do estúpido do Pedro, com as suas saídas românticas! Ai, valha-me Deus, se ao menos conseguisse estrangular aquela garganta doentia de cyborg mexicano talvez ele ganhasse juízo…! Não, a violência não resolve nada, portanto, tentei falar com o senhor sabichão para ver se pelo menos sabia o caminho de volta ao Château! Como iria explicar isto ao meu primo…? Além disso já eram dez horas e meia! Já devia estar pronta para dormir, no meu quarto, a ler um livro! Com certeza não me livraria de sarilhos e um longo e comprido sermão nessa noite!
Olhei para ele com ares de “por favor, arranja uma forma de eu voltar à minha casinha, senão, pagarás por isso” misturado com uma fúria incontrolável.
Ele, percebendo o que se estava a passar, virou-se como se não fosse nada com ele.
- O que é, bruxa vendida? – Perguntou ele, apontando para as minhas unhas. – Não sabes o caminho para o teu castelo com fosso e dragão incluído?
Que estúpido, eu sei no fundo, que apesar de ter duas personalidades, ser um criançolas incurável, brincalhão excelente, o Pedro é um querido e está sempre preocupado com a minha saúde e a minha vida. No entanto, é uma maçada termos de estar separados, pois os Cyborgs e os Bruxos Alemães são inimigos mortais declarados. Vou-te contar como é que nós, os Bruxos, e os Cyborgs começaram a brigar.
Há mais de vinte mil anos, chegou cá à Atlântida um chefe de uma tribo goda – original da Alemanha – julgando-se o chefe de toda a nossa pátria, bom, o tal chefe era o Duque von Tifon (Desculpa por me ter confundido os títulos), e decidiu declarar guerra, dizendo que esta pertencia ao povo godo supremo porque este o descobrira primeiro. Como vês, a mania da grandeza de os Alemães e dos povos do Norte – confesso humildemente que a Inglaterra também está nessa vergonhosa lista, quando toda a gente sabe que os europeus do mediterrrâneo, os latinos e os gregos é que são os mais espertos, que humilhação! – está já no nosso sangue há muito, muito, muito, muito, muito, muito tempo. Neptuno decidiu conversar diplomáticamente com o Duque, e, depois de sete dias de longas trocas de presentes e negociações, ambos concordaram enquanto Neptuno fosse vivo, os Alemães e todos os povos da Dimensão Mágica poderiam ser acolhidos com as melhores esperanças de uma vida melhor no continente mais avançado de toda Dimensão Mágica quanto a feitiçaria. Ora bem, os bruxos do norte, vendo a incrível magia que estava ao seu alcance, foram ambiciosos demais para compreender o Bem e Luz que emanava deste lindo país, e, assim nasceram os temidos e terríveis Assassinos do Amor, bruxos com poderes fora do normal, sedentos do sangue e carne das jovens raparigas atlantes. Ora bem, os Assassinos do Amor, cá para mim, não passam de uma lenda, e se calhar, gostarias de saber mais deles, mas lá chegaremos a seu tempo, tem paciência, está bem?
A princípio, esta lenda foi tomada de ânimo leve e ninguém quis saber do novo “protótipo de atlantes”, misturados com bruxos e mulheres atlantes, com energia virgem muito poderosa. Mas, dentro de um curto espaço de cem anos, surgiram coisas muito estranhas na Atlântida: o novo e misterioso, jovem e perverso Almirante Rewbertan Euncätzio, a Guerra de Poriavostin, a morte da Princesa Arco-íris e da Princesa de Fogo. Foi tudo tão rápido que os males tentadores desapareceram tão súbitos como vieram, e na verdade, durante pelo menos, dezanove novecentos mil anos, vivemos todos em paz e em harmonia, até ao dia em que a Serpente de Fogo regressar dos mortos e reclamar o trono. O resto, já sabes, não é verdade?
E por isso mesmo, nós e os Cyborgs não nos damos bem, mas, voltando à minha história, que isto da Cyborg Town tem muito que se lhe diga.
Subitamente, reparei nas horas, eram nove horas e ainda não tínhamos ceado em castelo meu, Ceús, que bênção! Vi que alguém andava a cantar nas ruas escuras mais baixas de toda a cidade com uma guitarra muito indiscreto! Nem sequer parecia uma pessoa que se chamaria de um senhor de guerra. Seria melhor que nos escondéssemos, pois, se fosse da polícia, certamente arranjaria desculpas para deter o meu pobre e inofensivo amigo. Poderia arranjar, a ambos, grandes sarilhos, dos quais, só daí uma eternidade nos salvaríamos!
Se ao menos houvesse onde não nos pudéssem ver, mas onde, com tantas escolhas…? Aquela cidade tinha tanto de indiscreta como de barulhenta, e, em qualquer lugar haveria um sítio onde ao menos uma boa alma tivesse pena de nós e nos acolhesse em sua casa…Se ao menos encontrássemos tal lugar, … Olhámos para a esquerda e para a direita, de cima em baixo e não vimos nem uma porta ou janela aberta. Mas já era de esperar, o black-out era às dez e meia, e, para não serem reprimidos pela SPV, os atlantes estavam habituaddos a apagar e a fechar as janelas uma hora e trinta minutos antes, e o cenário não só se passava em Cyborg Town, mas sim em todo o país!
Deste modo, acabaríamos no Anel da Serpente, numa cela especial, com toda a cortesia especial da polícia secreta, com inalação forçada de ópio e com camas rijas de correntes de ferro incluídas!
Foi aí, que, encontrámos a sombra de umas escadas onde ninguém nos encontraria!
Alegria das alegrias, finalmente conseguiriamos arranjar tempo para conversar e cimentar esta amizade, para que assim, não ficasse presa sob as garras de velhos bruxos afogados em licor e tiranos. Enjaulada sob as grades douradas de luxo e melancolia, e, se não me engano, a minha lista de pretendentes na classe de bruxos aumenta às dúzias, imagina a minha desgraça quando chegarem os Alemães, já não terei aquele amor
verdadeiro; secreto; ingénuo; sério; etéreo; é o amor mais bonito, deleite para o coração. Mas que acaba mais facilmente e que deixa feridas mais fatais, que nos acaba por matar, matando suavemente com o seu veneno, cada minuto sem o nosso amor parece um ano desperdiçado, sem ele não sabemos o que iremos fazer. Já não terei o amor verdadeiro….Serei forçada a deixar-me abraçar por braços estranhos, deixar-me beijar por lábios estranhos, porventura do meu padrasto…Que estranho, que estranho! Arrepia-me todo o ser cada vez que a repito, esta maldita palava, cada vez que a escrevo, parece que até o próprio Diabo me inspira! Que trágico destino, ai Deus queira que não seja verdade, estar condenada a apenas ser beijada por cavalheiros raquíticos, por anjos negros…! Ai Deus, protegei-me! Protegei a mim e ao meu amigo.
Guiai-nos até ao bom caminho, Senhor. Será que falo-vos apenas quando abro meu coração e a máscara de fria bruxa está tirada…? Dai-me humildade e agradeço por ainda estar viva, e… E… Por fim, peço-vos que mandai-me alguém em quem confiar, um pai, por favor, para acabar este pesadelo, para parar de ter maus pensamentos, ai, ajudai-me, senhor…Mandai-me um homem, um bruxo bom, que possa realmente compreender-me, ai senhor…
[1]
Ao chorar, não reparei que Pedro aceitou o meu corpo e abraçou-me, sorrindo ternamente, ele riu-se, e beijou-me na testa. Afinal havia alguém que sabia o que eu sofria, o quão forte eu tinha de me fingir, e acarretar com a dor da guerra.
- Não te preocupes, Jessica. – Disse-me ele. – Nunca te deixarei que te façam mal. Nunca, porque és minha amiga, não és? A única amiga que não se interessou na minha beleza, classe da pirâmide social, ou outra banalidade terrena, porque a amizade não é uma cena daqui da Dimensão Mágica, mas sim do Reino dos Céus!
Fria como sou, não dei a conhecer os meus sentimentos, e apenas o empurrei para ficar o mais discreta possível de qualquer demónio, bruxo ou cyborg que me visse. E lancei um olhar incriminatório, rindo-me, depois de ter limpado as lágrimas e retocando a maquilhagem.
- Pronto, não vamos tornar-nos emotivos ou coisa parecida. – Disse mais calma, arrumando o meu cabelo e fechando com delicadeza o estojo de sombras e baton na pequena carteira de cabedal preta. – Agora, se conseguíssemos voltar para casa…
O melhor dia deste Outono, sem dúvida alguma, o prazer e a amizade reuniram-se em apenas dois corpos, agarrados um ao outro, entrelaçados e destinados um ao outro pela fabulosa e potestade Providência Divina…
Subitamente, o oficial da Resistência apareceu sobre nós, a fumar pela cigarrilha, um vulto saltando de telhado em telhado, esvoaçando de prédio a arranha-céus, cantarolando uma alegre e cómica melodia atlante.
Sobre um cavalo alado, montado, indo ao sabor do vento, tão ocupado e numa correria aventurada, alheio ao som longíquo das metralhadoras e explosões de feitiços e encantamentos que acontecíam na Avenida Principal.
Era uma perseguição, estavam a tentar apanhar o cyborg, e, segundo estava a perceber pelo apregoamento em atlante, alemão, italiano e inglês, não era coisa boa.
Finalmente uma luz ao fundo do túnel, um oficial a quem poderíamos perguntar o caminho e conseguirmos chegar a minha casa.
Só tinha de falar a sua língua, e rapidamente estaria na minha querida caminha.
Então assobiei alto, chamando-lhe ao acenar com a minha mão cuidada e bonita, com uns olhos esperançosos e muito inocentes.

Horas mais tarde, estava com o tal cyborg, de vinte e sete anos, com o cabelo encaracolado curto castanho, mais castanho do que avelâs, olhos da mesma cor de chocolate escondidos sobre o capucho cinzento para cobrir a impureza do seu tronco descoberto de metal, com botas castanhas-escuras de couro gasto com os anos, e na cintura, em cada lado, uma letal adaga afiada em cada ponta pendia uma gota de um veneno azul-celeste tóxico. Caminhávamos na desertificada terra da Cidade Perdida, cujo único edifício nesta região que ainda alberga pessoas vulgares e ricas é o Château von Tifon na L’Amour de La Rue, no centro da cidade fantasma, com as vilas, as praças lindíssimas e mansões abandonadas por causa da Guerra de Poriavostin há mais de vinte mil anos, a nossa freguesia mais parece uma cidade após os bombardeamentos da 2ª Guerra Mundial, ou os arredores de um campo de extermínio nazi abandonado. É verdade, a Cidade Perdida costumava ser o centro empresarial muito movimentado e muito animado, agora, mais parece um cemitério. Cheira a morte por todo o lado, não há vivalma que ande por esta zona amaldiçoada da Atlântida, e é uma pena, porque um jeitonho aqui e outro para acolá e isto tornava-se num bonito país para se viver, mas enfim, como a Atlântida está toda ela amaldiçoada, não me admira que digam que as almas das pobres vítimas dos bruxos e dos Assassinos do Amor venham descansar em paz neste lugar trágico e horrível para os olhos duma pessoa sensível. Também estão afixados por todos os candeeiros em cada cem em cem metros, cartazes mais ou menos assim como está no topo da minha carta.
Da primeira que vi uma coisa sinistra e arrepiante como aquela à minha frente tive em consideração se os da SPV não seriam doidos varridos para espetarem uma coisa daquelas mesmo em frente de uma pessoa para ela ter um ataque cardíaco…!
Não devem regular bem da cabeça, devem ser meio-malucos, meio-malucos! Só pode ser, se calhar devem pensar que isso espanta os cyborgs de fazerem a guerra nessa zona.
Mesmo assim, Boing – era assim o nome do oficial cyborg da Reistência que me acompanhava até a casa – não ficou nem um pouco assustado com os repetitivos avisos que estavam presos com cola super forte.
E, no seu jeito meio cómico, andava com as pesadas botas sobre o cascalho de granito que, apesar de parecem um pouco difíceis de andar, eram mais macios que uma pena, e poderia andar-se sobre ele facilmente, mesmo assim, para mim era uma tarefa com uma dificuldade deveras elevada acompanhar o Boing e a sua energia espantosa na sua idade de oitenta anos, embora não o parecesse, ele tinha toda essa idade, e mostrava ser um homem muito apressado e valente.
No seu ritmo acelerado, em breve chegámos a L’Amour de la Rue, a rua em linha recta que tinha vista para o Château e dava mesmo para ver os portões de perto da minha linda casa.
Espantado com tal luxo e com a minha bondade, juntou rápidamente os punhos em forma de respeito e fez uma vénia profunda, deslumbrado com tal beleza.
- Menina, boas noites, despeço-me.– Disse ele a devorar-me com os olhos admirado e cheio de cobiça, esfregando as mãos em concha. – Que se faz por aqui?
Bati com os braços nas ancas cobertas com a mini-saia de ganga, com um ar carrancudo nos meus lábios, e olhei um pouco desiludida por não ter nada que fazer.
- Morre-se de tédio. – Respondi com um tom exagerado a abrir os portões com as chaves, vendo que já eram dez horas e meia.
Tinha de me despachar, senão, ouviria um raspanete de meu primo que jamais acabaria, e embora Boing fosse simpático; agradar-me; muito bonito e por fim o seu aspecto jovial conquistar qualquer rapariga, eu tinha de voltar para os bruxos, aqueles velhos endemoninhados e antiquados. É uma pena e uma ironia terrível: os bruxos terem aquela cara de maus e nórdicos, convencidos e com trinta acima, enquanto que os cyborgs terem aquele ar latino sedutor, alegre e amistoso. E digamos que quase nenhum Cyborg só deixa crescer a barba até se notarem uns engraçados e finos pontinhos pontiagudos de pêlo facial no queixo que nos deixa caidinhas, terem um estilo moderno e super cool. Sim, os Cyborgs têm esse karma espantoso; então, porquê pô-los da sociedade…? Será que os Bruxos não terão dor-de-cotovelo ou estarão com o monstro dos olhos verdes com os Cyborgs pelos segundos serem tão bondosos, amigáveis, lindos de morrer, e principalmente, não precisarem de magia poderosa e riquezas para terem as Bruxas e as princesas más e mimadas – os Alvos preferidos dos Assassinos do Amor e dos Bruxos, geralmente eles armam-se em galantes connosco. – aos seus pés…? É possível.
Afinal, não consegui conhecer bruxos nenhuns, mas pelo menos consegui ver o outro lado da guerra, e pelo que observei, os Cyborgs até não são maus tipos. Na verdade, até reparei que, se calhar esse conceito de os Bruxos serem velhos está fora de moda.
Talvez os mais novos sejam como rufias de rua com chapéus de feltro – Na Atlântida, esta mania dos chapéus de feltro pelos Bruxos nunca irá passar à história! -, botas rockeiras pretas de cabedal, com chicotes de pele na cinto de caveira de morte, cheios de anéis no anelar e no mindinho, luvas brancas de cetim para não magoar as senhoras, muito menos as suas vítimas, casacos de couro pretos, e no pescoço um colar largo de couro pendendo uma cruz dos templários de metal, mascando uma pastilha com as pernas cruzadas de calças de jeans da Lee, atirando uma moeda ao ar, ou talvez fumando um cigarro com a ponta dos lábios com um sorriso cínico e uns olhos que dão um ar muito sádico. Sim, deve ser o aspecto do bruxo moderno atlante, se este não for um agente da SPV, é claro.
Costumam andar por zonas da Atlântida obscuras como a Cidade Perdida, à calada da noite, com os leitores de mp4 a alto som, a abanar a cabeça de uma forma como se quisessem convidar uma dama inocente para juntar ao grupo de altos homens de entre os vinte e cinco até os quarenta e cinco anos, de braços caídos ao chão, com olhares frios, a fazer estalar os chicotes no solo apenas pelo sádico prazer de aterrorizar todas as criaturas do sexo feminino que se atreverem a dar a mão a um destes mulherengos da noite, normalmente, estão caídos de bêbados ou os cigarros que fumam são de hortelâ pimenta, e esta folha como tabaco é produzida na Alemanha da Dimensão Mágica com o tabaco de tal maneira, que o efeito é semelhante a de uma droga, que tanto Cyborgs como os Bruxos atlantes adoram fumar. Falam grosseiramente, com um vocabulário pouco variado e quando querem dizer a uma mulher que é bonita, gritam «Ò boa! Vem fazer companhia à gente!» Mas existe uma pequena diferença com os Bruxos e os Assassinos do Amor, e essa diferença está na sua etiqueta. Os Assassinos do Amor quando querem seduzir uma bruxa são mais ou menos assim, sibilando discretamente, na janela do seu Rolls Royce preto luxuoso e acenando com o indicador «Que senhorita tão bonita! Venha cá, minha bela criança, e farei com que esta noite seja inesquecível para si, minha adorável pérola.» E pronto, os bruxos são algumas vezes – raras são as vezes em que são pobres, isso jamais! – da classe média alta, ou mesmo podres de ricos, mas com aqueles modos que são um brinquinho de rapazes, que anjinhos, com auréola e asinhas incluídas!

Quanto aos Cyborgs, vestem-se normalmente, mas são na mesma grosseiros, e embora possam ser os dois grupos, alguns bruxos lindos, misteriosos e sedutores, e outros cyborgs de bom humor, gentil coração, e amigos de qualquer rapariga, ambos são homens, que se poderá fazer…? LoL
Bom, aproveita esta pequena carta, porque na próxima semana há mais de "Almas Siamesas, Gémeos Diferentes"!

[1] Isto foi escrito quando a tristeza da rapariga ainda estava num nível alto