quinta-feira, 21 de maio de 2009

Uma Noite em Losjafhden (Parte I)

Fazer a marmelada com um cyborg é como dormir com uma bomba-relógio, mas Sua Senhoria também não é nenhuma santa. Afinal, ela foi a esposa do Assassino do Amor.
Que obsessão a nossa – as Bruxas – de nos apaixonarmos pelos maus: primeiro o Mestre Samiel; depois o Primo Coutinho; o Nälden e o Major Scüller (no meu caso, claro, nunca conheci ou teve uma relação a sério com o primo ou com aquele louco); e, por fim, o Capitão Goldtheeth pela Solaris.
Agora isto! E depois o primo admira-se que a vida está complicada na Atlântida....!
Bom, quanto ao affair da Madame Serpente de Fogo e do Conde James Dark Sword, o melhor é só imaginares, porque aquilo que eles estavam a fazer era mesmo quente, mais arrebatador e volátil que o próprio Inferno!
Afinal, podemos chamar desta noite, uma noite agridoce....Eh, eh, eh...!

A chuva pingava e deslizava qual enorme exército de formigas por entre os telhados humildes de tijolo do pequeno e perpendicular apartamento da mesma cor da tijoleira, de apenas um andar na bonita Inctaluatalidenistados Rue – ou Rua dos Intelectuais com rampa de aço à moderna para subir ao parque privativo nas traseiras, com vista para as varandas do Castelo das Infantas – caindo precisamente em algumas taças os pingos da bênção repetitiva de Deus, e produzindo energia para toda a casa através de uma engenhosa invenção, cuja chave e forma como funciona seria demasiado complicada para explicar num diário para adolescentes – principalmente para duas como nós! O Castelo das Infantas tinha sido construído nos arredores de Cyborg Town, nos anos 70, em honra do milésimo aniversário da ponte cultural da Bellanária com o oriente, e também no pretexto de remodelar as estreitas e sombrias ruas de Losjafhden, os arredores mais a norte de Cyborg Town.
Seja Verão, seja Inverno, aquele é um bairro muito alegre, pois todos se lembravam da colorida pastelaria do nº 7, lote C do Rés-do-Chão. Era a famosa “Nuvem Doce”, como um sinal facilmente identificável: uma tabuleta que tinha pintado um pirolito em forma de uma engraçada nuvem branca com uma cereja vermelhinha no topo. Primeira porta a contar da esquerda. De manhãzinha, no Verão, consegue-se ver o simpático e cómico Dr. Tezcatlipoca, limpando e preparando a pastelaria amarela para os clientes, andando de um lado para o outro, e assobiando de forma jovial enquanto varre o chão.
Em tempo de aulas, a pastelaria só abre às seis da tarde, abrigando os pequenos magos e fadas, estafados depois dum grande dia. Uma coisa muito boa neste sítio é que não há absolutamente demónios ou bruxos alguns. Antigamente, este era um bairro santuário para demónios e miseráveis e cyborgs, ninguém se podia aproximar, Losjafhden diziam estar amaldiçoada desde a altura em que tinham chegado asiáticos para a ilha, há milénios atrás. Contudo, a Serpente de Fogo decretou que, a partir de 1978, não haveriam mais demónios a habitar esta parte de Cyborg Town, tão antiga, tão ancestral….Se olhássemos para a Losjafhden de há quarenta anos atrás, nem a reconheceríamos, da maneira como está diferente!...
O bem e as canções que se tocam ao vivo na rua são demasiado positivas para que alguma magia negra entre. Mas, a meio da noite, ainda por cima com a chuva, no Outono, a pastelaria pode-se parecer com algo um pouco pobre, mas, ao entrarmos, vemos que o ambiente é outro. As lâmpadas amarelas acesas iluminavam as relaxantes paredes douradas, debaixo do balcão de mármore cinzento, estava um enorme cão castanho a dormir tranquilamente, e a ressonar auditivamente, é um S. Bernardo que tem um sono muito leve. Os mesmos músicos tocam uma melodia mais calmante para todos terem uma boa noite de sonho.
Ao lado direito, há umas escadas de madeira que levam até dois quartos: o da direita tem uma porta verde-clara com um poster da Cyborg Town, como figura principal o próprio Euncätzio com um sorriso hipócrita e forçado, mostrando os seus dentes brancos, com uma bengala de uma águia na mão direita a acenar para as maiores atracções da sua cidade e agarrando a Serpente de Fogo pela cintura, esta usando um lindíssimo vestido de gala vermelho, a concorrer para ver qual é o sorriso mais falso daquele poster hediondo. À parte desta coisa horrível, tudo nesta casa indica para uma sensação de bem-estar enorme. A outra porta no cimo das escadas de madeira é a entrada para o quarto de Tezcatlipoca.
Realmente era um sítio agradável para se estar, um pouco pequeno demais para meu gosto, mas agradável. Pelo que tinha ouvido dizer por parte de alguns antigos miseráveis que viviam antes da mudança em 1978, o velho deus de origem azteca tinha renunciado à sua fortuna, ao seu terrifico poder, ao seu palácio e ilha privada, ao seu vergonhoso harém de dois mil e doze donzelas – para um velho deus com mais de cinco mil anos, ele atém tem um grande sucesso com as mulheres, hã; enfim eu não tenho nada a ver com isso, mas acho que isso são tudo patranhas inventadas pelos velhos amigos machistas da pré-história do Palácio das Reuniões – para vir trabalhar naquela vila pacífica, em 1979, para poder ir viver com Susana Linsra. É óbvio que, quando isto se soube na sociedade bellante, foi um autêntico escândalo. Uma fada a viver com um deus, ainda por cima uma fada que estava noiva?!... Primeiro, culparam a mãe do Pedro por estar a desviar o “Príncipe dos Príncipes” por maus caminhos, segundo, a maior parte das deusas ciumentas que planeavam acabar os seus dias de imortalidade com um dos deuses mais invejados do Palácio das Reuniões decidiram abrir um processo para mandar fechar o Nuvem Doce, e é preciso sublinhar que a maior parte das “Senhoras”, num dos dias do julgamento, falaram como se fossem mulheres da raça dos Demónios!
Para os que não sabem – e devem ser muitos – cada classe aqui na Bellanária tem o seu próprio dialecto, digamos…O seu próprio sotaque. É suposto os Deuses bem honrados falarem o Bellante Arcaico, mas aquilo que os deuses ouviram no julgamento não era nada mais do que uma versão aristocrática de um sotaque mexicano misturado com uns quantos palavrões em Bellante Corrente!... (continua)