segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Sonho de Burlesco


Antes de passar a ficar consciente, os meus poderes escondidos deram-me outra visão, e quero confessar-te que ontem foi a noite mais aterradora de toda a minha vida! Um dos hotspots favoritos do meu padrasto no Dia da Magia Negra, quando ele pode finalmente sair da toca do Castelo Negro…pode não parecer lá grande coisa, aquela enorme vivenda vermelha situada numa rua secundária e sombria chamada Rua das Framboesas, com cerca de oitocentos e quarenta metros de comprimento, ajuntada a uma série de edifícios com mais de duzentos anos, cheia de lojas baratas e pensões de terceira categoria, onde não podem passar os carros; mas era, com certeza absoluta, o esconderijo perfeito para que a Serpente de Fogo e os seus capangas me escondessem. O ícone do clube Red Witch é uma autêntica caricatura pornográfica da Serpente de Fogo num vestido preto, e…como é que eu sei todas estas coisas…? Porque o vi!...
Meia-noite menos um quarto: as cortinas das enormes janelas estavam cobertas com cortinas verde-cinza, de modo a que as únicas formas de luz eram cinco velas de fogo vermelho a brilhar vivamente numa mesa de café ricamente decorada com flores selvagens tais como dente-de-leão; beladona; rosas; silvas; e vinhas de uvas dos campos de setenta mil anos da Cidade dos Deuses. Na penumbra, à esquerda estava um espelho de dois metros suficientemente grande para uma pessoa passar por ele partido em bocados, e à direita, uma mulher pequena, pálida como a cal, com pinturas vermelhas e pretas esquisitas na cara, seminua, permanecia deitada num espaço delimitado por um giz de mercúrio em forma de losango, com a barriga para baixo, a cheirar directamente um incenso esquisito púrpura.
Era uma espécie de cerimónia ou coisa parecida, ela pronunciava palavras incompreensíveis em Atlante Arcaico – uma versão antiga do Atlante que tem mais de cem mil anos – contorcendo-se em si própria, fazendo repetitivamente com uma facilidade incrível posições de Yoga que só um verdadeiro mestre nessa arte de relaxamento conseguiria atingir. Agora podia supor com toda a minha certeza que ela está completa e definitivamente louca!
Segundo os meus estudos em Magia Negra, ela estava a invocar um bruxo do Limbo dos Espelhos, e parecia não estar a resultar. Esta técnica de magia era utilizada pelos bruxos mais experientes e poderosos, mas nem uma bruxa com a idade de noventa e um anos conseguia atingi-lo na perfeição.
Graças a Deus que tirei um curso acerca de Atlante Arcaico para compreender o que ela continuava a murmurar entre dentes:
- Grande e Supremo Deus da Morte e do Mal Atlante, eu vos chamo, meu Mestre!
Ò Aquele que exterminava almas e corpos de imbecis fadas com um só dedo, erguei-vos das trevas e fazei sentir o vosso majestoso poder!
Grande Filho de Tsesustan, Rwebertan Samiel Tristan Euncätzio, eu vos INVOCO!
As fatais doze badaladas soaram por toda a Atlântida, e aí, nem um som de fantasma ou cheiro repugnante se fez sentir, mas sim toda a Atlântida mergulhou numa onda de um perfume de homem forte demais para se respirar, e uma brusca neblina tão espessa como uma sopa de batatas e ervilhas cobriu por completo a Lua.
Porém…Dez minutos passaram….E nem sinal do tal “Deus da Morte” que a maluca referia nos seus bizarros cânticos.
Esforços inúteis eram aqueles, não achas?
A mulher começou a ficar impaciente, batendo com o pé no tapete vermelho de fogo infernal que tinha comprado especialmente para aquela ocasião.
Não seria apenas imaginação sua ou tentativa falhada de ver o seu ex. Marido…?
Afinal, nunca se sabe o que pode dar a uma viúva…!
Levantou-se daquela posição tão desconfortável, achando estranho o bruxo estar atrasado, e ainda com os pés descalços no tapete da sua própria energia mágica derramada, os seus olhos pintados de negro começaram a arregalar-se, enquanto esperava já com a mostarda a subir-lhe ao nariz.
Pedira a solidão absoluta em todo o hotel só para ela para todos os oficiais da SPV, explicando-se que era um assunto secretíssimo de Estado, que não seria revelado a ninguém; gastara o equivalente à riqueza dum sultão ao “redecorado” o seu “cantinho”; ainda por cima passara a manhã inteira a preencher uma papelada do tamanho de não-sei-quê para ver navios….?!
Se ele não chegasse pelo menos até à meia-noite e meia, aquilo certamente não iria ficar por ali, não senhor.
Ali estava ela, a fazer figura de ursa, apenas com um biquini de ouro puro e com um manto vermelho de seda pura e uma coroa de diamantes sem mais ninguém, e com um ar de poucos amigos.
- Bebé, amorzinho…- Disse ela de forma dissimulada, mas logo mudou para um tom, digamos mais alto. – APARECE, CASO CONTRÁRIO VAIS TER A PIOR NOITE DA TUA VIDA, SEU IDIOTA!
Saltando e lançando vigorosamente um vaso de porcelana pela porta, despedaçando-o aos bocados, a irada e histérica mulher estava incontrolável!
- SEU CRETINO MENTIROSO DE UMA FIGA! APARECE, SENÃO…
De nada valeram os seus agudos gritos de ira, que ecoaram qual rugidos de uma tigre fêmea por todo o arranha-céus, ressoando o “senão…” com uma força tal que o seu querido espelho de cerimónias quase se partia.
Mal ia derramar a primeira lágrima de ressentimento por ter confiado em superstições idiotas quando um surgiu vulto esguio sobre-humano: vestes negras como a cor da morte, não distinguindo completamente o rosto ou forma, ou o quer que aquele diabo fosse, de uma estatura alta, que, comparado com a Serpente de Fogo, este era um gigante escondido por entre chamas vindas do Inferno.
A sua voz poderosa e severa, com um misto diabólico de astúcia na pronúncia e sotaque atlante, disse sarcasticamente:
- Por que gritais, Majestade?
O monstro robusto apontou para os ponteiros do relógio da avenida, anunciando meia-noite e ponto.
Aí, a mulher corou de vergonha, baixando a cabeça sem saber que fazer. Tinha mandado adiantar a torre principal da Atlântida na Cidade dos Deuses meia hora para receber os convidados a tempo na festa, e com os seus compromissos, esquecera completamente de arranjá-lo pontualmente para receber um convidado ainda mais ilustre e poderoso dos que os outros à meia-noite.
É mesmo distraída, tem os genes sonhadores da Sara, que se há-de fazer?
Fez uma vénia profunda ao senhor, ajoelhando-se solenemente qual bela e educada dama que julgava ser perante o fantasmagórico espelho, e baixou os olhos como se fosse escrava do espelho, literalmente.
Não percebia nada do que estava a acontecer, mas pelos vistos, aquele devia ser o amante a que a mulher é tão dedicada. Talvez o Finistergäse trabalhe para ele…
Quando se levantou, olhou para o seu “Mestre” de uma forma quase de meter dó, e limpando inocentemente as lágrimas, e fingindo-se de mártir, soluçou numa voz suplicante:
- Bebé S…Sabes que o prazo para me levares daqui está quase a chegar ao fim e eu…
Mal ia falar a próxima palavra, o homem ou fosse o que aquela besta era, interrompeu-a friamente:
- Amanhã!
Sabendo o que aquilo significava, a desesperada e condenada rainha ajoelhou-se duma forma humilhante, fazendo uma incrível cega para não olhar directamente para o Diabo, chorou cada vez mais.
- Faça com que o prazo se prolongue um poucochinho. – Sugeriu ela sem outra alternativa, num tom graxista. – Sei lá…Mais uns meses, semanas… Por favor, tenha piedade de mim, Vossa Excelência. Sessenta e seis anos passam depressa demais para uma Nobre de vinte mil! Por amor da vossa Virtuosidade, não me conduza ao implacável Castigo Eterno!
A voz do espelho respondeu de uma forma rígida:
- Nen!
Foi então que a escorregadia e falsa bruxa esboçou um sorriso malicioso, dirigindo-se para o espelho de uma forma confiante, mostrando o seu belo corpo ondulante e sensual de um lado para o outro.
- Trago para o meu senhor uma nova vítima! – Comentou com um brilho maldoso nos olhos claros de víbora. – A minha jovem e bonita amiga de maquilhagem já está presa nas masmorras lá em baixo pelos meus homens, ela, que nunca pisou o vosso reino obscuro. É uma alma apetitosa, ainda na flor da idade, ingénua, mesmo que se diga sabida da vida.
De que pobres coitados aqueles dois estariam a falar? Achas que estavam a falar de mim? Só espero que não!
O diabo, mais interessado em saber mais acerca da rapariga, perguntou:
- E que deseja essa formosa duquesa?
A Serpente de Fogo soltou uma risada sádica, qual uma hiena que não está boa da cabeça, contente por se ter livrado de mais uma possível rival.
Limpando delicadamente as longas unhas com uma lima como se fosse uma famosa estrela de cinema, ela respondeu de uma forma irónica:
- A tola acredita mesmo que um dia irá desenterrar o misterioso passado da sua família, e por que razão os seus pobrezinhos pais a abandonaram. Uma historieta comovente como só se vê em filmes pirosos, até apetece vomitar de tão estúpida que é.
Terminada aquela resposta, passaram-se três longos minutos, até que o lúgubre homem coberto na escuridão do vidro disse enigmaticamente:
- Seis meses de fortuna, no sétimo ocorrerão uma catástrofe enganadora!
Que planos diabólicos eles estariam a tramar…?
Um sorriso maldoso e cheio de esperança apareceu logo na cara da falsa mulher.
Estaria a mentir-me quando afirmou que eu era, de uma certa forma convincente, a sua única verdadeira amiga....?
Parecia bem que sim, já que esta era uma bruxa invejosa da beleza de qualquer mulher que se atravessasse no seu caminho. Disso eu posso ter a certeza, os olhos azuis grandes dela brilhavam de triunfo.
- Querido bebé, ò Senhor da Vida e da Morte; faz com que essa estúpida encontre o seu derradeiro fim. Que o dia 6 de Junho de 2006 seja teu, das tuas mãos, transforma as suas em mãos assassinas! – Declarou sombriamente a maldita mulher. – Com elas, a desgraçada cravará nas costas do seu amado cyborg um punhal, condenando-os ao desespero; a eles e a toda a Atlântida para que só tu, meu adorado Mestre, governes com as tuas trevas este reino!
- Sim… - Murmurou a voz, num tom terminal e sinistro…Que bizarros e estranhos segredos a Cyborg Town me estava a reservar…?!

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Fen Li - a "Baronesa dos Demónios"


Fen Li Ning Michaela Di Euncätzio era a sobrinha mais nova do Assassino do Amor, e talvez, a seguir a Enoque Pedro Di Euncätzio, uma das figuras do Clã Di Euncätzio mais popular na Bellanária. Ela ganhou, entre a comunidade dos Demónios, o apelido de “Santa dos Alpes”, por ser muito generosa e apiedada dos mais desafortunados. Passou à história como santa e mensageira dos Deuses, tendo sido reconhecida até pela Igreja Cristã como beatificada e canonizada em 1435, dois mil anos depois da sua morte. Na Bellanária, na parte cristã, particularmente, ela é popularmente conhecida como Santa Baronesa Michaela, mudando o nome para um ar mais ocidental, e as iconografias da mulher em si não condizem com as descrições que o tio da jovem faz sobre ela na “Biografia Crónicas da Minha Vida”. O facto de ser de etnia oriental não condizia com a descriminação racial que havia no tempo dos descobrimentos.
O título de Baronesa já fora atribuído aos dezassete anos, por ser tão condolente, corajosa, com uma eloquência impressionante, dominadora de várias línguas, e inteligente.

Aos doze, fora viver com o irmão mais velho para a Bellanária, em casa do tio deles, o Assassino do Amor; na China, o pai morrera muito jovem, e a mãe já não os podia sustentar.
Assim, conheceu as gentes Bellantes e os Demónios e Fadas e outras tantas criaturas mágicas, as quais teria um amor maternal que nunca se separaria, até ao fim dos seus dias. O seu génio notara-se logo ao conseguir dominar a língua bellante, e em escrever fantásticos discursos oratórios sobre a liberdade das mulheres e o estado deplorável em que viviam os Demónios.

No entanto, a vida da jovem aspirante a Kinnary[1] – equivalente bellante na linguística para Baronesa e tipo de Fada, metade cisne, metade mulher, que era uma espécie de embaixatriz das deusas mais importantes, e que se encarregava dos assuntos de Estado como se fosse uma secretária de Estado – nunca foi um mar de rosas.
[1] Ser originalmente da mitologia tailandesa, metade cisne, metade mulher, que personificava o amor e a beleza feminina

Teve de enfrentar o seu cruel e possessivo tio, que, alguns dizem, desenvolveu uma paixão pedófila pela sobrinha quase doentia, vendo nela as qualidades necessárias para a sua “Bruxa Perfeita”. Por muito que o Assassino do Amor a quisesse afastar do mundo exterior e mágico que eram as Fadas, ela sempre arranjou maneira de escapar às suas garras, pelo menos enquanto foi, legalmente menor, que, naquela altura, era até aos vinte e quatro anos de idade para as mulheres e dezasseis para os homens. A sua inteligência, combinada com a força e determinação do irmão mais velho, Quing, deram origem a muitas histórias, das quais se conta que o primeiro encontro com Samiel, em que este os recebeu na maior pompa e luxo, oferecendo-lhes um manjar digno de Deuses, para uns dois meses depois, quando tinha a confiança ganha com os dois irmãos, ter relações sexuais com a própria sobrinha. As suas tentativas pedófilas foram muitas vezes frustradas, pelo menos com Fen Li, ela era da família dele, e isso deu origem a também muitos escritores estrangeiros escreverem sobre Quing e Fen Li, nomeadamente os irmãos Grimm, com a história de “Hansel e Gretel”, é claro que «…quem conta um conto, acrescenta um ponto, mas, neste caso, não censuro o facto de terem falado sobre a nossa família, ocidentalizando a nossa vida…» confessou anonimamente um membro da família Di Euncätzio no século dezanove, agora desaparecida para todo o sempre. Na autobiografia do Assassino do Amor, ele conta, no poema, como é que a sua monstruosidade e loucura levou ao ódio e confusão por parte da sobrinha:


Ai, Fen Li, de pai e de esposo,
O teu nome me faz suspirar,
Esse inocente fogo delicioso
Que primeiro nos faz palpitar!...

- Oh, não vás, donzelinha inocente,
Não te vás a esse engano entregar,
E amor que te ilude e te mente,
É amor que te há-de matar…

Só a tua visão,
Pequena inteligência
Artificial,
De papel vegetal,
És uma boneca,
Recheada com caramelos de clemência.

Atingir a tua meta,
Alcançar a tua suave e macia mão,
Que parece quase a última sílaba de um não,
Acariciar,
E deliciar,
Os meus olhos famintos com a beleza que
Estive prestes a condenar…!


Não há nada em ti que queira
Mudar,
A tua alma estremece mais
Do que uma fogueira,

E eu, feiticeiro cruel, enamorado,
Espírito nocturno que assusta os animais,
Apercebeu-me, que,
É uma maldição não mais ver-te,
Emaranhado,
Aprisionado,
Condenado,
Pago pelo crime de amar,
De te beijar,
Querida fragrância de Primavera,
Viver-te no leito da minha morte, entristecer-te,

Lágrimas de anjo caído que jamais poderá
Te apreciar,
Anjo divino,
Elegante, de tecido frágil e fino,
Oxalá que ninguém te apanhe,

Ou a minha alma jamais, ninguém,
Amará…! ´


Mais tarde falarei no Grito da Verdade sobre ela….

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

"Ancient Conspiracy on the Dancefloor !



O meu Padrasto, é tudo culpa dele, e ainda bem que consegui afastar-me daquela louca. Eu tentei um largo sorriso, e, indo em direcção à saída, a rir-me, disse:
- A senhora é que está com pele de galinha, não eu. Como queira.
A bruxa, fazendo uma cena com os olhos lacrimantes e juntando as mãos como se fosse conduzir-me para uma oração, olhando para o céu de uma forma piedosa (só faltava a auréola para se fingir de santa), agarrou na minha perna direita.
Que é que ela queria…? Até parecia o fim do mundo, eu só ia deixá-la por uma hora, que mal tem nisso.
Mas como na verdade a Madame é uma toxicodepente cobarde como sei lá o quê e só se sente protegida com um par de gorilas sem cérebro, burros que nem uma porta e que têm ambos a altura do Monte Evereste, lá estava eu a arrastá-la pelo chão até que chegámos à saída.
- Docinha, meu bem, não te esqueças de estar aqui à meia-noite e ponto, é uma promessa, bebé! – Implorou ela. – Mas lembra-te, lembra-te! Serás maldita se aos teus princípios de boazinha inglesa voltares, e o teu amor aqui mesmo encontrará o seu fim! Para sempre, para todo o sempre, serás do Tsesustan, e ele te dará, a ti e ao teu amado cyborg, a terrível condenação ele fará com que vocês partilhem, a tua eterna maldição! Chauzinho!
Revirei os olhos, um pouco irritada com aquela cena digna de uma comédia, e, abrindo forçosamente a porta com o peso da estúpida mulher em baixo, e suspirei em sinal de reprovação de tal peça.
- Eu sei! – Comentei sarcasticamente. – De nada, a senhora também é uma santa que ninguém poderá imaginar! Agora faça o lindo favor de largar a minha perna que só tenho duas. Até já, Chauzinho!
Acenando com a mão, fingindo que estava contente, lancei um último olhar ternurento e de amizade para com a minha nova amiga, acalmando-a. Mas…Sabia, não, pressentia que onde quer que estivesse, o meu padrasto estaria muito satisfeito por ver eu sucumbir por fim ao sentimento humano e cair na tentação; pois a sombra de um homem alto sinistro parecia estar a rir às gargalhadas, mas estranhamente não se ouvia nem um único som da sua boca…Que cambada de malucos. Eu sempre disse que a cidade não era boa para a saúde das pessoas, mas francamente. Até parece que os Bruxos citadinos não se habituaram à ideia que o isolamento é a melhor forma de aumentarmos os nossos poderes. É esquisito, sempre que penso no meu avô, lembro-me sempre de Deus, mas não é de admirar, sabia sempre o que eu queria, conhecia-me tão bem que até acho que quando era pequena, acreditava que ele era o meu anjo-da-guarda. Jamais se zangava, e a sua voz tão clara e sincera emitia um calor paternal tão amoroso…
Obviamente, quando eu fazia algo mesmo mau, ele castigava-me justamente, nunca me bateu, bastava uma semana sem televisão ou ficar sem sobremesa para eu compreender, depois, ele dava-me um beijo na cara e dizia-me na sua maneira tão bondosa «Eu não me quero zangar contigo, Jessica, mas algumas vezes é preciso.»
Ao caminhar num passo acelerado para o metro na pequena paragem na praça principal, tentei não dar nas vistas para não ser apanhada desprevenida por algum demónio ou fantasma. Respirei bem fundo e entrei no transporte público sem uma única gota de medo, mas quando me sentei confortavelmente na cadeira, pensei se seria boa ideia dormir com a Serpente de Fogo.
O meu sentido de dever falava mais alto que o meu amor e curiosidade pelo padrasto que apodrecia no Castelo Negro.
Seria boa ideia libertá-lo…? Ou era apenas uma loucura pueril criada pela minha mente jovem e ingénua, incapaz de compreender a grande e sombria conspiração que se passava na Bellanária…?
E quantas mais dúvidas a minha cabeça armazenava, mais tentada eu me sentia em fazer tão inocente crime. O meu avô decerto não aprovaria, muito menos a minha actual família, mas era a única maneira de saber quem era esse obscuro homem, esse tal padrasto que me torturava a mente. Ele (O meu Padrasto) chegara à minha vida de surpresa, e, sem qualquer aviso, me enchera mistérios e enigmas por resolver.
Chegara a hora do meu destino seguinte ser revelado. Iria para o caminho do Bem ou do Mal…? Escutaria as sensatas palavras do meu Avô ou iluminaria o caminho escuro para ver o rosto do meu Padrasto…?
Pondo a minha cabeça sobre as minhas mãos, deitei umas tantas lágrimas, guardando-as na minha mão, perguntei em voz alta:
- Porque espero? Que irei fazer?
Uma voz fria ecoou de súbito nos meus ouvidos:
- A decisão é sua, Menina Jessica. Se assim o desejar, eu mando abrandar a máquina caso queira telefonar ao Herr Duque Von Tifon para o prevenir. Que direcção do caminho deseja tomar? Diga-me só o caminho e deixe o resto comigo. Guiarei a sua vida, jovem Fräulein!
Virei-me assustada para a frente e vi um pequeno bruxo a conduzir o metro, com o rosto cobrido pelo chapéu, e de certa forma, eu sabia que ele estava a sorrir para mim, à espera da minha difícil escolha.
Olhei pela janela de vidro, e reparei que havia algures lá fora no caminho escuro iluminado apenas por algumas lâmpadas que deixavam a desejar, pondo uma simbólica bifurcação: a seta da esquerda era para um atalho para voltar para trás, o da direita ia direitinho para a Cidade Perdida, para a minha casinha e cama quentinha.
Se fosse para a esquerda, estaria a abrir as portas da liberdade ao Diabo na forma humana…? Mas se fosse para a direita, jamais descobriria a verdadeira natureza de todos os segredos que antes me tinham sido escondidos e negados…..!
Então, numa tentativa desesperada, fiz opção: levantando-me, com um ar jovial no olhar, ordenei ao condutor:
- Para a Cidade Perdida, mas pode ter a certeza, caro senhor, que eu não vou desistir de saber quem realmente eu sou!
O misterioso condutor de baixa estatura acenou com a cabeça:
- É valente, mas isso não chega para enfrentar o seu padrasto, minha querida. Coragem não provada, não basta para vencer o passado. E, infelizmente para si, doçura, o tempo é a única coisa que não se pode parar, mas sabe que a vontade do Mestre ultrapassa tudo….
Num tom de terror, com um olhar penetrante que arrepiaria até o mais poderoso e bravo de todos os Cyborgs, coberto por uma capa preta, acrescentou:
- Sua Excelência, o meu amo, ele consegue tudo, ele triunfa sempre…! Sabia que na vida real, o Mal ganha sempre no fim!
Ao dizer estas palavras, começou a repeti-las, fingindo bater num bombo, e na verdade, o metro começava a ganhar velocidade cada vez que ele repetia a oração “O Mal ganha sempre no fim!”, de uma forma simplesmente infernal e diabólica.
As minhas pernas tremiam como varas verdes numa implacável tempestade e já andávamos a trezentos km’s por hora, sem ele conduzir o “metro fantasma”! Parecia um autêntico pesadelo, só que desta vez era real. Terrivelmente real! Só me apetecia gritar, mas em vez disso, apertei fortemente contra o meu peito a pequena chave, tentando manter-me calma.
Desconfiada da forma sinistra como aquele homem falava, forcei-o a virar-se para mim, e vi em vez de um bruxo, um perfeito boneco feito de cera à escala real, deitando a língua de fora para mim, com sete velas a flutuar assustadoramente sobre a sua cabeça, cada uma delas pregada com treze agulhas formando um místico símbolo: um losango negro, com um florete, um k e uma rosa a atravessar o losango; o símbolo do Mal Supremo!
Aí é que não aguentei mesmo, aquilo estava a ficar igualzinho a um filme de terror.
Explodi, e, com a mostarda a subir ao nariz, dei um grito de horror à medida que tudo ia ficar escuro….

domingo, 5 de outubro de 2008

"um mistério indecifráfel...Quem matou a minha mãe?"


Não fazia sentido: primeiro, a Serpente de Fogo comprara “O Cavalheiro”; segundo aquele bruxo alemão viera ter comigo; terceiro, seis bruxos que eu nem as minhas amigas sequer conhecíamos convidavam-nos para um baile, para logo se esfumarem que nem fumo; agora aquela malvada rainha queria que eu libertasse o meu padrasto do Limbo dos Espelhos…?! Essa conspiração cheirava mais mal do que os cozinhados do Samurai Dourado, ou eu não me chame Jessica Magnetite Von Tifon.
Mas, e se ela quisesse mesmo ajudar-me, pelo olhar piedoso e inocente, com a sua voz meiga e boa, era quase impossível recusar.
- Eis uma das muitas chaves do Castelo Negro. O Herr Finistergäse pagou mil marcos por ela há trinta anos. – Disse ela, respondendo as minhas dúvidas. – Com esta beleza poderás libertar o teu padrasto do castigo eterno. Mas as portas da liberdade e da magia no Castelo Negro têm um elevado preço.
A minha resposta automática em relação à menção do meu padrasto na conversa foi ir directamente para a saída, com um olhar de desprezo e nojo contra a mulher de magias negras proibidas. Ela sabia a minha fraqueza, mas como raio teria descoberto…? Talvez esse Finistergäse lhe tivesse dito. Mesmo assim, era preciso jogar pelo seguro em vez de confiar numa víbora falsa e, com as mãos retorcidas num gesto de recusa à tentação, tentei ir-me embora.
- Não acredito em ti, velha bruxa! – Insultei friamente. – Além disso, porque raio eu gostaria de libertar o meu padrasto?
A mulher balançou lentamente qual exímia encantadora de crianças a pequena chave num fio de ouro da espessura dum fio de cabelo, e sorriu duma forma sedutora, entregando gentilmente a chave na palma da minha mão, e com o seu “dedo mágico”, encantando o fio, tornando-o numa serpente que se enrolava na ponta dos meus dedos.
- Pensa bem, querida: ter um padrasto talvez não seja assim tão mau. – Disse ela num tom agradável ao olhar fixamente para o pequeno réptil prateado que segurava na chave com a boca. – Se bem conheço o teu padrasto (e conheço-o) ele foi injustiçado. Havia um canal mal ligado, um fungo no labirinto da sua cabeça que não funcionava bem.
Dizendo isto, fez um sinal desenhado com chamas de fogo com os seus longos dedos degenerados pelo tempo e exposta às magias de Tsesustan.
Sorrindo, no entanto a tremer, suando por todo o corpo, mostrando o quanto receosa ela estava acerca deste feitiço, acrescentou com um tom fino e irritante:
- Por mais que nós, bruxas, queiramos, minha querida…Um quadrado não pode ser um círculo.
Que estaria ela a dizer…?! Não estava a dizer coisa com coisa. De certeza que estava medo daquele “amante misterioso”. A sério, nunca a tinha visto com tanto medo, e normalmente, o motivo da sua histericamente é pura excentricidade, mas aquilo era um medo de morte! Já tinha ouvido dizer que a esquizofrenia e as drogas tinham muitas vezes príncipio dos Anos 30 levado a Serpente de Fogo à loucura e à morte, numa dança de vários corruptos e perigosos entre ela e oficiais nazis; escândalos de triângulos no começo da Guerra Civil (1936-????...+∞) nas mais poderosas esferas da Resistência; catástrofes de atentados contra a sua vida, tanto do lado dos Bruxos como dos Cyborgs.
Mas o pior de todos estes crimes foi embarrilar os Nazis, não sei o que se passou, mas o que quer que ela tivesse feito, eles não gostaram da partida. É o seu maior pesadelo, e todos aqueles que habitam na Atlântida, quer sejam deuses ou demónios, conhecem o único ponto fraco da diabólica e valente mulher, que apesar de ter só um metro e cinquenta e cinco – uma estatura considerada minúscula para alguns oficiais da SPV que têm dois ou três metros de altura, o que é simplesmente uma mulher assim tão pequena meter medo a homens tão musculados que até parecem gorilas com cérebros do tamanho de amendoins – mete respeito e medo a todos.
A razão para a sua psicótica doença mental foi ter testemunhado um homicídio de natureza tão horrível e desumana aos dezoito anos de idade (ela nasceu em 1911).
Toda a gente o diz, e toda a gente sabe cá na Atlântida que os parafusos da bela e estranha mulher de noventa e quatro anos estão a cair de ano para ano.
Qualquer dia…Adeusinho razão! Fiuuuuuu…! Estás a perceber o que eu quero dizer, que qualquer dia ela fica com os miolos tostados. Ainda ontem estava a perguntar porque raio a Serpente de Fogo é assim ao jantar. E todos me responderam que ela tinha visto alguém assassinar a minha mãe. O problema é que parecia que sempre que lhe perguntam quem era o louco que nos fizera o favorzinho de ficar sem Katharina, ela desculpa-se com uma história qualquer que o maldito tinha-a ameaçado que se algum dia ela tentasse pôr as coisas a vir ao de cima, este voltaria para fazer a sua vida negra até a enlouquecer, e conduzi-la a um estado de demência incurável! Eis o pior medo da mulher mais valente de toda a Atlântida: de ficar mais louca que é!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

A Chave do Túmulo da "Besta"


O Dia das Bruxas é uma noite mágica, disso, ninguém tem dúvida, mas o que eu não sabia, é que seria assim tão reveladora para o meu passado…!
Um humano que queira ser bruxo morre três vezes: na vida mortal, na vida moral, e na vida espiritual, só assim, é que se poderá aceder à pior prisão: o Castelo Negro.

A "Pura Princesa Swerdinada Arco-ìris de Fogo" também tem defeitos.


Podia muito bem ser verdade como podia ser mentira, mas o que a Serpente de Fogo estava a fazer na sala não era ficção: gritava de agonia, tentando fingir que não tinha exactamente gritado com um dos servos dum dos seus amantes mais perigosos, e, durante um quarto de hora, aquela peixaria continuou, com ela a andar constantemente à roda, como se tratasse de um pião gigante, para por fim parar meditar nos seus erros.
Estava mesmo em sarilhos não achas? Os seus olhos encheram-se rapidamente de lágrimas, e, pegando irada num vaso de porcelana, atirou-o contra a estátua do seu pai, o grande deus Neptuno.
- Odeio-te, PAPÁ! – Berrou numa voz aguda irritada. – ODEIO-TE, PAPÁ! POR CAUSA DA TUA ESTÚPIDA PREFERÊNCIA PELA MINHA TONTA IRMÃ, ESTOU AQUI A MORRER!
Subitamente, uma voz feminina indagou nas sombras do salão vazio a rir-se:
- Olha só quem está com a mostarda a subir ao nariz? Mete-me dó, Vossa Majestade!
Ela virou-se nervosamente para mim, fixou-me com olhar terrível durante uns momentos, depois soltou uma risada aguda convencida digna de uma bruxa.
Saberia ela o sofrimento e curiosidade porque eu passava…? Tinha lido os meus pensamentos…? Talvez sim.
Que estaria ela a preparar com os seus caldeirões…? Tirou habilmente da sua minúscula mala de pele de cascavel verdadeira verde-escura uma fita métrica, e começou a medir a minha cintura como se quisesse saber se eu era gordinha. A fita longa de cores quentes em vez de centímetros tinha como unidade de medida pequenos caracteres atlantes que correspondiam ao destino de cada pessoa. Já tinha ouvido falar daquelas coisas chamadas “adivinha-métricas” numa conversa com a Sara, mas nunca pensei que existisse mesmo, afinal são tão caros que só para os destinos mais inúteis é preciso desembolsar cem euros!
A Serpente de Fogo percebe mesmo desta coisa da magia negra. Ao tirar notas das medidas exactas, e do meu negro destino – a minha cintura apontava para um estranho losango com duas rosas.
Depois, esboçou um sorriso misterioso, e começou a mexer continuamente, sem razão nenhuma, com um brilho estranho nos olhos azuis claros (já te disse que ela pode mudar a cor das suas íris, umas vezes para verde, outras para azul, outra para negro, e outras para vermelho de sangue!), na sua mala. O aspecto piramidal da pequena carteira do tamanho inacreditável de uma maçã deixava-nos a pensar como é que poderia ser possível guardar tanta coisa num sítio tão pequeno.
- Olhos de sal perturbados não ficam bem a uma bruxa bonita como a nossa querida e bela Jessica Von Tifon. – Comentou ela a atirar batons, gloses, estojos de maquilhagem, frascos de perfume de todos os tamanhos e formas. – Muito menos a uma duquesa da Bellanária. Por isso é que adivinhei que ias passar a noite da Magia Negra no Castelo Negro, além disso, tenho o dom de falar com os mortos.
Só ficou satisfeita até encontrar por fim num compartimento secreto da carteira verde-escura, uma chave do tamanho de uma semente de mostarda: uma horrível serpente azul indigo estava enrolada no seus adornamentos, devorando a sua própria cauda de escamas ásperas e secas, e o
aspecto da chave de prata com ouro era horrivelmente sinistro, com uma rosa de marfim incrustada no meio.
O pequeno objecto prateado brilhava na palma da mão escorregadia e hidratada da mulher qual um pequeno diamante raro.
Isto começava a ficar interessante…Os meus olhos viraram a sua atenção para a pequena maravilha.
Com a sua longa unha de bruxa do indicador, ela apontou para o raro utensílio. Parecia reluzir a sua luz vermelha de uma forma tão atractiva como diabólica.
Agora é que eu estava a somar as parcelas, aquela estúpida e o bruxo que andava sempre atrás de mim eram meros fantoches nos fios de outra pessoa mais inteligente.
Uma pessoa que tivesse neurónios suficientes para saber que a filha da filha mais velha da mulher do grande Duque Von Tifon teria uma certa influência e conseguiria para seu próprio proveito certos documentos importantes. Enganar um homem assim seria mais difícil do que eu pensava. Seria o meu padrasto o autor daquela palhaçada toda…?

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Herzogtum Von Tifon...


Depois do grande contributo que todos eram para que o Grito da Verdade continuasse a ser uma realidade, aparece um novo Blog na minha lista de blogs que escrevo: Herzogtum Von Tifon (Ducado dos Tifon), um Blog que apresenta tudo o que há para saber acerca da família de Jessica.
Desde o preguiçoso e imortalmente arrogante gato persa Spiegel, até ao lado mais oriental da família.

A excêntrica família alemã mais louca de toda a blogoesfera está de volta, neste Blog, dedicado exclusivamente à Cidade Perdida e a “Eles”…


Não percam…! Em http://herzogtumvontifon.blogspot.com/

Um abraço, de todos os Von Tifon...

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Comentários precisam-se (urgente)



Há sempre algumas pessoas nesta vida que pensam que a vida é algo efémero...Não é, é imortal!...

Por favor, atenção a todos.........! O meu blog e diário pessoal foi atingido por uma crise de falta de inspiração aguda.

Peço a todos os bloggeiros que, se quiserem ajudar, façam um inventário acerca do meu blog, um comentário geral de todas as coisas que viram e que personagens gostariam que se realçasse mais no blog....Um grande obrigado e beijo a todos.

Até 16 de Setembro, teremos este pedido acertado em primeira mão na minha agenda, mas se não receber nada, terei de fechar os dois blogs...

mais uma vez, muito obrigada pela vossa colaboração

domingo, 24 de agosto de 2008

Dia da Magia Negra em Cyborg Town (parte I)


As luzes das lâmpadas, ténues e enfraquecidas pelo nevoeiro, pousadas de dez em dez metros seguidamente no jardim que separava o caminho do metro do dos carros, plantado com bonitas árvores de cerejeira, iluminavam a bifurcação e o grande palácio do Cavalheiro e da estação de metro, mesmo atrás do Anel da Serpente, que era o edifício por onde eu tinha saído.
De resto, só restava como companhia a escuridão das esquinas e travessas labirínticas e apertadas pelos grandes edifícios negros da velha cidade cosmopolita, com alguns datados do século dezoito, que, certamente, faziam contraste com o gigante moderno governado pela SPV. No canto direito do ringue, havia também o Quartel-General da nova rival da centenária Serpentis Politza Vigitz: os SOS, ou, os Serviços Obscuros de Segurança, como são chamados ironicamente, fundados em ’95 pelo General B. Cá para mim, apreciar a diferença entre a antiga Faculdade de Letras atlante e o Hotel Anel é como distinguir um shot moranguito de aguardente: têm os seus nomes próprios, mas o sabor e a sensação duma enorme ressaca e prováveis vómitos é semelhante.
No entanto, é fácil perceber que, ao conseguir este palácio barroco – a velha faculdade que servia anteriormente para ensinar humanidades, línguas e letras – o General B ficou muito bem servido. Talvez até bem mais servido que o seu novo patrão, o Goldtheeth, que ocupava agora os sete andares abaixo do chão do Anel da Serpente. Não havia dúvidas que o hotel centenário, agora intitulado pelo povinho como Casa SPV, era maior que o Palácio Eleonora (eles aqui têm uma estranha mania de adorar a realeza, não achas?); porém, à semelhança das pizas, o gosto é raramente uma questão de tamanho ou melhor massa.
Lá ao fundo, no caminho à esquerda depois do imponente Teatro Parisiense, havia uma antiga auto-estrada que se dirigia para Sudoeste, para a Cidade dos Deuses. Enquanto que, à direita, se estendem, por vezes, alguns bruxos a caírem de bêbados, a meio da noite.
Essa estrada, sinuosa e rodeada de árvores frondosas – tão altas quanto o próprio arranha-céus que se destacava na avenida pelos seus 600 metros de altura – tem um desvio que dá para o sinistro Vale da Morte, e também para o Castelo Negro.
Aqueles pinheiros bravos emanavam já de si uma certa aura infernal, quanto mais o próprio terreno acidentado a dois quilómetros de distância ao olho nu dum bruxo.
Apenas a Lua Cheia alumiava o céu escuro, coberto por ameaçadoras e tristes nuvens azuis-escuras.
Kalixt já ia andando, a descer apressadamente as escadas bem polidas qual porcelana fabricada na Marinha Grande da entrada do edifício, mal disposto por ter falhado a sua missão, com as mãos retorcidas qual lobo submisso que põe a cauda para baixo, com receio que o seu senhor o punisse por tão humilhante fracasso, quando viu uma grande máquina preta à sua espera, aliás, a porta sinistra do longo veículo abriu lentamente, como se a própria e temida Morte estivesse à espera do Bruxo do Fumo, para o engolir num sono eterno!
O espesso e denso nevoeiro, qual gás prateado sonífero fazia com que as pessoas, principalmente as Fadas, os Deuses, e os Feiticeiros Brancos adormecessem à medida que a noite sem estrelas caía suavemente debaixo das suas insuspeitas cabeças. Era quase impossível ver um palmo com o tempo assim tão confuso, porém o bruxo sabia muito bem por onde ia. Que planos ele estaria a tramar…?
Este encanto prodigioso era naturalmente provocado pela atmosfera de magia negra do feriado, mas havia algo mais que pairava no ar. Mas o quê é que eu não conseguia perceber. Espreitei discretamente pela janela, para ver o que se estava a passar.
Utilizando os meus poderes, consegui ver o que se passava no carro.
O bruxo conversava sozinho, parecendo bastante arrepiado e desconfortável…?
As suas mãos suavam constantemente, como se falasse com o próprio Diabo, e desta vez, não era ele quem estava a fumar, mas sim o seu patrão – o padrinho dos Bruxos, talvez – numa boquilha mais arrepiante do que a do seu servo, com um fumo mais tóxico, outra ouvi uma voz vinda do Além, dum homem vestido com preto deitado numa cama especial negra de cabedal arranjada no luxuoso automóvel, qual rajá perto das suas odaliscas, ou melhor dizendo, perto do motorista que conduzia e do ganancioso bruxo do fumo. A sua voz soou-me tão gélida – decerto que seria o General B, reconheceria aquela voz metálica e aguda em qualquer lado – quanto um movimento dum perigoso glaciar, e sua dicção ameaçadora ponha-me os cabelos em pé:
- Não faz mal, você fez o que pude para ganhar a confiança da Fräulein Jessica. Arranjarei maneiras de o recompensar, e pode ter a certeza que serão generosas.
O ignóbil servo acenou apressadamente com a cabeça, trémulo e esboçando os dentes amarelos e podres qual hiena horrorosa que era, estendeu a mão ansioso.
- Sim, meu senhor! – Exclamou ele impaciente. – Agora…Voltando aos mil marks que o senhor me deve de salário atrasado…Não podia dar-mos aqui mesmo? Vá lá, pastéis verdes é o que não falta a Vossa Excelência…Eh, eh, eh, eh…
O dono do carro soprou propositadamente uma espessa nuvem de fumo azul-escuro mesmo à cara do outro bruxo. Pensando bem, até aposto que aqueles três eram de um sindicato de criminosos alemães qualquer que tinha vindo fazer uma “visita turística” para fazer um servicinho a um cliente que não lhes agradava nada. E o de voz de trovão com eco gelado seria o chefe. O manda-chuva, estás a entender?
Era o mais discreto, e o fumo misturado com a neblina era surpreendente doce e muito forte, qual…óregãos misturados com hortelã-pimenta.
- Paciência, meu útil escudeiro. – Interrompeu o de voz arrepiante. – Com o câmbio monetário e o passar dos anos esqueci-me completamente…
Subitamente, a feia carantonha quadrada do bruxo perdeu o seu característico sorriso sádico e funesto do costume e foi substituída
- Mas…Senhor, Vossa Excelência sabe muito bem que não tenho dinheiro nenhum para pagar a Liberdade Condicional. Os rapazes israelitas do Palácio das Reuniões já estão a desconfiar de eu estar a ser tão lindo menino e por ter pagado com as minhas despesas o seu bilhete para ir ter com as suas meninas sem que uma data de fadas lhe venha fazer a vida negra! – Explicou-se com ar preocupado.
Misterioso e cruel, o chefe da quadrilha soltou uma gargalhada sarcástica qual bode novo acabando por terminar uma batalha, refastelado no sofá, fumando satisfatoriamente o seu cigarrito “ocasional” preso pela boquilha como se nada fosse, e, ao estalar os dedos, para depois o frio motorista fazer levitar um saco de couro verdadeiro, a tilintar de moedas sonantes, eram tantas quanto o milho, e, pousaram no colo do homem, que logo as fez balançar num movimento como se fosse um pêndulo à frente do bruxo desesperado.
- O que são dois mil euros entre amigos, não é verdade? – Comentou cinicamente, rindo-se ao ver o quão desesperado o outro estava. – Não fique com essa expressão, o dinheiro não é tudo.
O outro bruxo começou a contar minuciosamente as moedas no saco com as suas mãos pequenas e afiadas, qual garras nojentas e amanteigadas de energia mágica pastosa de mulheres demónio, para caso o diabo viesse a tecê-las. Tinha razão, não ficando contente com a quantia, atirou a massa para fora do carro com as suas mãos oleosas.
- 500 Marks?! – Perguntou abismado. – Onde está o resto? Há trinta anos tínhamos combinado que se eu lhe safasse de todos os problemas públicos e privados acerca daquela coisa-horrível-que-não-se-deve-pronunciar-senão-morremos-todos, me daria mil marcos em moedas, e o que é que eu vejo? Metade! Metade das minhas poupanças para os meus filhos!
O da voz arrepiante apenas pôs as luvas ensanguentadas de cabedal áspero nas costas do outro, dando vigorosas palmadinhas nos ombros como forma de camaradagem, e soprou qual cobra cuspideira uma estranha seta de fumo que indicava para o arranha-céus. Havia algo de inquietante naquele bruxo que não inspirava confiança a nenhum dos outros dois, subordinados pessoais, mais novos que o chefão.
E, sinceramente, digo-te que eu também não gostei lá muito do ar arrogante e cínico dele quando o ouvi e vi, pelo menos a sua silhueta (estava tão escuro que nem dava para ver a cara). Aquilo cheirava muito mal, e posso-te dizer que não era do fumo do tabaco que os dois do bancos de trás inalavam, mas sim que havia qualquer tramóia ou conspiração contra a Atlântida, eu sentia-o nos meus braços com pele de galinha
- Digamos que os outros quinhentos marks só serão devolvidos quando você terminar uma… “tarefa facílima” que foi concebida especialmente para si. – Indagou o chefe dos três bruxos, fumando mais um pouco. – Seja complacente, em breve, daqui exactamente a quatro meses, terá o seu dinheiro de volta. Já para não falar nos extras que lhe darei finda a tarefa.
Estalando novamente os dedos, dirigiu-se para o motorista que estava nos lugares da frente, e apontou a boquilha negra a arder qual ponto de referência azul assustador para o próximo destino.
- Walter, podes ter a gentileza de acompanhar o nosso “convidado” até minha casa? – Ordenou o frio e estranho bruxo. – Certamente que ele deve estar exausto depois deste grande dia. Já agora, abre-me a porta para eu poder entrar neste edifício…
O bruxo do meio, espantado, apontou com um olhar vazio para o Anel da Serpente.
- Senhor, não quero ser mal-educado, nem desrespeitar a sua autoridade, mas esse hotel, a partir da meia-noite só recebe o General B ou o Capitão-mor. Com essas excepções, só mesmo o Presidente do PR é que pode entrar lá. Além disso, Vossa Excelência ainda está muito fraco para poder revelar-se....
Mas era tarde demais para outras conversas, e mal o bruxo do Fumo Sinistro ia acabar a frase, já o tal “Walter” pregara a fundo e deixara o seu amo a passear por entre a neblina, e desapareceu por completo, tal como o seu carro negro, deixando ambos um rasto de inúmeras perguntas, das quais o grau de dificuldade para mim era areia a mais para o camião. De que estariam eles a falar…? Com certeza o dinheiro envolvido era a maneira de ambos negociarem os termos para conseguirem os seus objectivos…E teria aquele bruxo alguma coisa a ver com o meu padrasto…?

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Tsuna Miyu Franziska Von Tifon


A minha meia-irmã, que é filha legítima do meu padrasto – tentar matar a própria filha, se há burrice maior do que esta, então não sei se ele estava mesmo bêbado ou muito furioso!
Até acho que o poço de virtudes dela é tão grande, tão grande, que ela já se deve teve afogado nele…!
Uma santinha do tamanho do meu polegar (e pensar que o meu Padrasto é um bruxo gigante), a Tsuna Franziska, com uma vozinha fininha, de rouxinol, com uns olhinhos oblíquos, bonitos, com, um nariz pequeno e pontiagudo, aquilino. Atrás das costas, carrega um aroma lindo, feminino, ondulado a pêssego, um néctar precioso no qual a saia cor-de-laranja fica-lhe perfeitamente bem, e, sob uma linda camisola amarela, ela voa, dum lado para o outro, arrumando as suas coisas para ir para a escola. É claro que a cinderela chinesa – isto digo eu na brincadeira com a minha queria maninha mais nova – não foi como na história do conto de fadas, e a madrasta bruxa Katharina adorou ter uma rapariguinha tão linda como enteada. Foi a mãe da Tsuna que pediu à Sra. Duquesa misericórdia, e para que salvasse a pequenita das garras do meu Padrasto, que não queria que a coitadinha crescesse nas mãos dum bruxo que sofre de priapismo – nem queiras saber o que é que é.
Contudo, ainda estou para perceber as razões (porque devem ser muitas) que levaram a minha mãe e a Serpente de Fogo a quererem fazer-se de Fadas Madrinhas de todas as infelizes que encontram pelo caminho. Pior que elas, só a nossa família a recolher cães de guarda.
Primeiro foi a mulher demónio Yokai, mas essa, essa, eu nem sequer tinha nascido e a Katharina era pequena demais para dar por isso, além disso, ainda estava em Londres. Depois a prima Solaris. Depois a Sara. Agora esta. Tsuna. Minha Nossa Senhora dos Mais Arrependidos, onde é que terão desencantado esse nome?! E dizer que eu já fico furiosa quando alguém me chama de Jessicazinha. O Hans um dia deu em chamar-me Janeca, mas as consequências foram tais que perdeu logo a vontade de repetir a graça. Porque eu cá refilo, faço cara de má, resmungo, dou caneladas, respondo torto só como eu sei. Mas esta não. Esta lê as Manhãs do Campo Atlante, tem noivo escolhido desde o berço e acha que o casamento é a melhor coisa do mundo.
Da Yokai, como acima referi, não me lembro lá muito bem dela, muito menos a minha mãe. De resto, a Serpente de Fogo também não gosta de grandes conversas sobre ela: passa a vida a chamar-lhe de mal-educada, malcriada e ingrata, e até tirou a fotografia dela, que estava em cima da cómoda do quarto privado da nossa respeitada Rainha, e substitui-a por uma pose horrorosa da minha Tia-Bisavó Rokorubi quando foi de excursão a Hiroshima.
A Sara, enfim, tirando as suas paixões diárias e sonhos de fadinha ingénua, e estes últimos tempos em que o Paulo lhe deu a volta à cabeça, segundo a família, não era má de aturar. Na escola, diz sempre que ela é a minha irmã mais velha. Acho mesmo que, se fôssemos da mesma família, até nos podíamos divertir imenso.
Mas esta. Que necessidade tinha a minha mãe de a trazer, uma vez mais, para cá? Tem pai, mãe, irmão (Xaninho, que horror! Como é que alguém pode ser irmã de um Xaninho e não morrer de vergonha?!), noivo escolhido (Meu Deus, como é que uma pessoa com treze anos pode pensar em casamento e não morrer de susto?!), casa imensa lá nas Índias, ou nos Chinos, onde moram, criados à volta, que ajudam a fazer e a desfazer as malas – enfim, aqui, também é assim, aparte do Xaninho e de noivo escolhido, excluídos, perfeitamente.
Mas não. A boa da Sra. Dona Duquesa Katharina Von Tifon teve logo de oferecer cama, mesa e roupa lavada assim que soube que lá nessas lonjuras e ásias por aí fora podia haver criados em terracota, mas não havia escola secundária para as mulheres. Preparatória, e toca a casar-se com o primeiro mancebo de olhos rasgados e a estudar o livro do Mao-Tse-Tung, ou lá como aquele comunista chinoca se chama, com muito tostãozinho e casinha quente para oferecer. Então a minha mãe lembrou, com tremidinhos na voz e lágrimas ao canto do olho o tempo em que ela e a mãe da Tsuna (Tsuna, que nome, como é que uma pessoa pode acordar todas as manhãs com este peso na alma?!) Eram amigas, e, por mor dessas antigas recordações (a infância, seja de quem for, comovia sempre muito a minha falecida mãe, quanto mais a sua própria, o meu Padrasto até foi forçado a dar uma fotocopia de quando ele era pequeno, pousando para a câmara com uns dez aninhos, “…um anjinho loiro com umas bochechas que a tua mãezinha era capaz de as comer todas…”, nas palavras da Serpente de Fogo). Aí vem a criatura de avião comigo até à Cidade dos Deuses, acabando por aterrar no quarto à minha esquerda, onde há-de permanecer por todos os séculos, até que se forme na Faculdade dos Bruxos e das Bruxas, em Cyborg Town.
A Sara também começou assim. Mas, segundo o primo Horus, ela tinha ficado órfã quando a mãe morreu mal a minha amiga tinha dez anos. Além disso, era afilhada do meu avô, havia «responsabilidades», como diz o Honestoffmann.
Começou assim – e acabou por encontrar o Paulo, sabe-se lá em que galáxia, com as suas borbulhas e o seu 5 em Poções na Universidade dos Feiticeiros.
Se isto não tivesse acontecido, se calhar ainda estava a viver em casa e eu não tinha agora de aturar esta convencida com um Lao de quarenta anos à sua espera lá na terra das Chinesices, e com um nome de peluche. Coisa que, por acaso, me faz uma urticária dos diabos. A mim e ao meu Padrasto, que, por acaso, ficou com receio que a sua filhinha ficasse em mau cargo dum dragão chinês de quarenta anos que mora no palácio celestial de jade, ou lá como aquilo se chama.
Estranho às vezes como coisas tão graves podem acontecer devido a pequenas coincidências, pormenores aparentemente sem importância. Se a minha mãe tivesse ficado em Londres quando tinha dezasseis anos, ela não teria perdido a virgindade com o meu Padrasto em Berlim, e, depois não se teriam conhecido. Se a Sara tivesse ficado na sua Floresta de Cristal de asilo e não tivesse ido trabalhar nesse dia, não teria encontrado o Giovanni, ou o Paulo, ou lá como ele se chama, não teria casado com um feiticeiro branco, o quarto ao lado do meu não estaria vago, a Tsuna não teria vindo.
A quantidade de «ses» que eu não podia agora inventar! Afinal, o Galileu está redondamente enganado: a Terra não gira em torno do Sol, a terra gira em torno dos «ses». Se os Portugueses não tivessem partido em busca de novas terras, não teriam descoberto, nem o Brasil, nem a Atlântida, nem a China, e muito menos o Japão, e não estaria-te eu a mandar estas coisas para o Blog. Se o meu pai se tivesse atrasado no emprego no dia em que esbarrou com a minha mãe na Avenida do Volta-a trás, eles não se teriam conhecido, eu não seria eu, seria outra qualquer. Se o parvo do Himmler não tivesse insistido em ver a Atlântida, provavelmente, nunca teria a Princesa Swerdinada, e, já estaríamos numa república democrática a esta altura do campeonato. Se Samiel não tivesse aberto uma pastelaria na Atlântida…bom, aqui é que eu já não estou muito certa do que é que teria acontecido – mas teriam acontecido coisas muito más, porque o professor de História está sempre a falar nisso. Mas é tudo muito complicado e no dia em que ele explicou melhor, eu estava com uma dor de dentes que nem via, e ralava-me lá bem com a pastelaria do Assassino do amor, ou com o nariz de quem quer que fosse.
Mas pronto, como diz o meu Padrasto, «as coisas são como são», e não há nada a fazer senão aguentar a rica prenda que me coube em sorte.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Beijinhos e Muitas Poções (o fim da festa)


E, já começavam a despedir-se da “prezada senhora e brilhante dama que teve uma ideia tão excelente como essa”. Os homens, um de cada vez, a vestirem-se, dando um beijo na mão da anfitriã quase meio tonta com aquele entretenimento todo. Olhando-a de baixo com uma expressão de ambição e ardor de um desejo secreto de fazer sexo com a Serpente de Fogo, abrindo as portas para as damas da alta sociedade passarem primeiro, dando palmadinhas nas costas uns dos outros, os senhores coronéis, os senhores engenheiros, os senhores doutores, os senhores advogados, dizem os habituais «…Então encontrarem-nos em minha casa para a tal desforra, e Vossas Mercês não irão faltar à promessa, não é, meus caros?...» E lá respondem os outros senhores coronéis, os senhores engenheiros, os senhores doutores, os senhores advogados, sorrindo como se fossem camaradas de liceu, com um brilho hipócrita e cínico nos rostos falsos, embora já tenham acima de cem anos, com as mãos atrás das costas «Com certeza meu caro! É para isso que servem os amigos, não é verdade?» Ora esta! Querem enganar quem, aquelas cenas eram cómicas, era como ver na televisão um daqueles encontros internacionais com líderes políticos, apertando as mãos, todos gentis e amáveis. Depois nas costas, gritam como sei lá o quê! Que estupidez, mas o pior de tudo ainda estava para vir…
As mulheres, com os seios quase à mostra, abanando enquanto mexericavam como vizinhas das janelas, fartas de ver os bruxos a fazerem olhares ameninados, levando para todo o lado os seus casacos de pele caríssimos, a tresandar de perfumes Channel Nº5, correndo à pressa, com os bicos dos saltos altos partidos, agarrando com uma mão os sapatos e outra no braço dos maridos com um cigarro na boca, dizendo «…o seu chefe de cozinha tem de me enviar por e-mail essa fantástica receita daquele estufado de demónio com aguardente, minha querida. Assim o meu homem talvez me ligasse mais, se é que me está a perceber, Vossa Divina Senhoria conhece os Bruxos como ninguém! Os homens são mesmo assim, todos iguais, principalmente com mais de cento e setenta anos! A partir dos trinta anos, não prestam para nada, só festas, amantes, energia roubada de jovens adolescentes, e a propósito, Vossa Alteza: onde é que encontrou esse vestido, foi na Cidade dos Deuses?» E Sua Majestade responde com uma pontinha de sarcasmo misturada com o bafo doce do haxixe, agarrando-se a um poste, desatando às gargalhadas, que é afinal o seu namorado, o meu querido Primo Von Tifon. «Lamento, mas já não há para o seu tamanho tão grande, compreende, minha querida?» Víboras masculinas e femininos, era o resumo possível da descrição dos convidados para a gala da noite n’O Anel da Serpente. Que bando de convencidos e vaidosas com uma arrogância e malvadeza tão estúpida. No entanto, mantive a minha dignidade, e não disse nada, ficando no meu canto.

terça-feira, 15 de julho de 2008

O oriente, o ocidente, o Norte e o Sul...


‘…- Ò Papá, mas afinal que história é essa de centauros, feiticeiros e fadas? – Perguntou com um ar vazio, mastigando os pedaços de pão com fiambre e queijo.
- É uma longa história de facto, filha. – Comentou ele, continuando a acarinhar o seu gato, passando a mão magra pelo pêlo áspero do felino, pensativamente.’



Fiquem pois a saber, todos os que ainda estiverem interessados no meu blog – pois, porque tem poucas visitas ultimamente – que, uma vez que tenho pensado em pôr a história da “A Lua dos meus Sonhos” num concurso de literatura que há, em Portugal, não sei se os júris me deixam publicar obras que já foram postadas no meu blog – o Grito da Verdade – portanto, não sei se continuarei a publicar a continuação da história, para além de que é muito longa (tem 376 páginas, aproximadamente). Só para vocês, planeei um resumo dum pouco da história.


Fiquem Bem …. ;-)
Annelina Sara, uma rapariga lindíssima de quinze anos e filha dum feiticeiro branco vagabundo, um andarilho famoso pelos seus grandes feitos no príncipio do século, é a única testemunha viva dum assassinato a uma importante figura da classe das Fadas, enquanto que a Princesa herdeira do trono da Atlântida, a perseverante e a poderosa viúva do Assassino do Amor, Swerdinada, se mete em sarilhos ao enviar Manuel Irmãozinho, um feiticeiro português com um grande sentido cínico de humor, investigar uma misteriosa Irmandade criminosa de terroristas perigosos, do qual, o líder, permanecendo em segredo, puxa os cordelinhos para que aconteça uma futura guerra entre Fadas e Bruxos.
Entretanto, Katharina Von Tifon, uma femme fatale e agente da Abwehr descobre que o seu ex. Namorado nazi é o responsável e agente especial dessa irmandade, que controla um atraente aprendiz de bruxo italiano de vinte e quatro anos, e possível suspeito, que vem a ser o centro das atenções dos Nazis.
Um turbilhão de intrigas, batalhas entre espadas, e desamores desencontrados, onde os Anos 30 e a Atlântida são um palco dum romance multicultural que percorre os quatro cantos do mundo, desde as florestas verdejantes mediterrânicas, até ao mundo oculto e obscuro dos Espiões, tanto ocidentais como orientais, tendo como personagens pessoas de todo o mundo, centrando-as num único espaço, que é, precisamente, o local de várias aventuras, dramas, comédias e tragédias a um estilo completamente novo, inventado por esta vossa escritora. Um trago de pimenta, cereja, azeite e chocolate para vos saciar a curiosidade, com personagens femininas e masculinas numa luta entre a igualdade e a superioridade.


Mil desculpas pelo incómodo.

domingo, 13 de julho de 2008

A última canção...


De uma forma ou de outra, a pequena Princesa Sara substituiu aquela víbora venenosa, e cantou até melhor que ela, toda a gente a aplaudiu pela sua linda voz, inclusive a própria e única Serpente de Fogo, que resmungava entre dentes palavras como “aquela judia estúpida” ou “bastardinha duma figa”.
A inocência e timbre angelical vindo da fadinha de dezasseis anos combinado pelo som sobrenatural do Nälden ao piano era quase como um bálsamo para os ouvidos de qualquer um. A sua vozinha, meia sussurrada e suave, relaxava e fazia as delícias de todos os que a ouviam, e, por uns breves minutos, toda a Atlântida acalmou-se para escutar aquele prodígio musical.
Até o coro composto pelas fantasmas e bruxas, criadas da Serpente de Fogo, pararam as suas vozes estridentes e cómicas para ouvir aquele sonsinho espantoso.
A letra, originalmente escrita por Samiel, unida com a orquestra e o talento da jovem, dava uma divina sensação de paz e harmonia lindíssima!
Lembrava a voz da minha mãe a cantar em Alemão a famosa canção “Lili Marlene”, e num tom embalador, Sara embalava humildemente os Bruxos presentes com a sua voz de anjo a cantar a versão da melodia atlante na língua germânica quase fluentemente.
Depois dos longos aplausos, “bis”, “bravos”, e gritos de todas as classes lá na fora na rua que estavam a ver a nossa tímida menina a cantar a última canção cantada pela maravilhosa amante do Assassino do Amor, surgiu, tão misteriosamente como desapareceu, o nosso anfitrião por detrás das costas da rapariga, que o olhava muito assustada e imóvel, sem saber o que dizer. Era natural, uma pequena fada judia vinda duma zona campestre como a Floresta de Cristal não estava acostumada às luzes citadinas e tecnologias do novo milénio. Era também normal que a ingénua menina não se sentisse nada à vontade diante das câmaras e achasse um pouco incómodo aquele barulho e agitação toda da grande metrópole atlante.
Pelo contrário, o “General B” batia palmas e esboçando aquele sorriso tão característico da sua personalidade que não inspirava confiança, contente por encontrar aquela jovem “lira viva” tão bonita.
Baixando-se para ver o que o destino lhe trouxera, ele soprou o fumo da sua boquilha com uma arrogância desprezível para a rapariga, transformando-a numa pequena serpente azul a sibilar num tom interesseiro.
Via-se logo que o Goldtheeth é um mulherengo, mas agora já estava a exagerar, quando a fumarada tocou levemente qual carícia fria no rosto delicado de Sara, fazendo com que ela tossisse abruptamente.
Seria mesmo o Chefe da SPV que estaria por detrás daquela fantasia bizarra e excêntrica...?
Enfiando o pau do microfone quase perto da boca da rapariga, ele olhou para o seu amado público com ar meio terno, meio perverso.
- Sim senhor! – Exclamou ele a rir-se. – Mais uma salva de palmas para a....Oh! Claro está, hoje estou mesmo distraído: wie heiβen Sie, minha jóia? Como é que a menina se chama?
A jovem, sem saber o que fazer, corou tanto quanto um tomate mesmo vermelho, e, encolhida, conseguiu apenas gaguejar:
- Sara....
A Serpente de Fogo, já um pouco recuperada da entorse, deitada num sofá, esboçou um sorriso mesquinho.
Virando-se para ela, olhou-a de alto a baixo e lançou-lhe um olhar rancoroso, como se quisesse que aquela menina nunca mais fosse feliz.
- Oh....Se ela não é amorosa...! – Interrompeu num tom trocista. – Mas...Poderá uma judiazinha sem pimenta e triste como essa rapariguinha mal vestida cativar milhares de admiradores como eu? Acho que não, queridíssimo público.
Depois soltou uma risada diabólica digna da mais pior e ciumenta de todas as bruxas, aliás, se houvesse uma eleição para Rainha das Bruxas, a Serpente de Fogo seria a escolhida. Como se aquilo que ela é disse tivesse piada....
Aquela mulher é mesmo malvada, para tentar humilhar uma pobre rapariga de dezasseis anos e vingar-se duma coisa que aquele anjo nem sequer fez.
A pequena rapariga suspirou muito chateada e cruzando os braços, decidiu não fazer caso quanto àquela cobra, a Sara nunca foi lá grande adepta da violência, tanto física como das palavras. Ela sabe muito bem que pessoas como a venenosa da Serpente de Fogo não merecem a atenção de absolutamente ninguém, por isso, ignorou-a simplesmente.
Apetecia-me dizer umas quantas àquela...Já nem tenho adjectivos para descrever aquela horrorosa.
Ninguém se mete com os meus amigos, muito menos com a minha melhor amiga Sara que me acolheu se olhar para as diferenças sociais ou nacionais ou raciais.
Então, olhando-a com um sorriso tão sarcástico quanto anúncio a uma companhia de seguros, levantei a mão ousadamente, exibindo as minhas unhas limpinhas e pintadas de um verniz roxo.
- Já que gosta tanto de julgar as coisas, porque é que não nos fala do dinheiro que milagrosamente apareceu para a organização desta gala? – Perguntei num tom frio.
Ao que a Serpente de Fogo respondeu, mantendo o veneno na língua e com aquele sorriso falso:
- Queridíssima Sra. Duquesa Von Tifon, todos os senhores e senhoras nesta sala sabem que o dinheiro dado pelos mesmos e comida remete para os meus pobrezinhos meninos lá longe no Afeganistão...
- Sim....Vossa Alteza, disso toda a Atlântida está farta de o saber – Disse uma voz no meio dos convidados. – Mas como é que explica os impostos cobrados às nossas crianças atlantes apenas por não saberem ler nem escrever?
A mulher virou-se colericamente para todos os lados, como um cão-de-caça raivoso, nem acreditando o que aquele convidado indesejado se atrevera a dizer.
Com os olhos lacrimantes de uma forma quase demoníaca, e à beira dum ataque exaustivo de histeria, ela olha com ar incriminatório e ameaçador para as câmaras, que, felizmente para a nossa política exterior, já tinham sido desligadas pelos soldados da SPV.
- Quem disse isso? – Interrogou ela num tom penoso. – O estúpido que apareça agora, senão eu nem sei o que faço!
Com Nälden, o Primo Coutinho e Tsuna sob vigilância, todos os olhos se centraram chocados em Serpente de Fogo. Infelizmente, os dela escolheram-me a mim e eu pus as graçolas de lado, sentindo que o drama ainda não tinha acabado.
Perante vários segundos desconfortáveis, limitou-se a olhar, lembrando-se sem dúvida de que eu a vira perto do Château Von Tifon, a Rainha e Presidente da República Nacional Atlante, crédula, tola, vendida – fraca.
Para a mulher que se vê como a Madre Superiora do Anticristo do Mestre Samiel, tudo aquilo era demasiado. Chegando-se muito próximo de mim, tão perto que eu conseguia sentir o seu Channel nº5 no seu rosto maquilhado e pestanejando furiosamente, com a boca num rito de desprezo, deu-me um discreto pontapé na canela com a ponta do sapato de salto alto.
Gemi de dor, mas mantive-me imóvel, quase em sentido.
- Estragou tudo, sua londrina idiota! – Disse ela, tremendo. – Tudo. Está a ouvir?
Sorri entre dentes e gemi friamente:
- Foi apenas uma demonstração dos poderes da minha família, mais nada.
Acho que ela até era capaz de me pontapear novamente, se não fosse a oportuna intervenção do General B, ou do Capitão-Mor Goldtheeth, ou fosse lá quem fosse aquele homem.
- Posso certamente comprovar isso. – Disse ele. – Nestas circunstâncias, talvez fosse melhor guardarmos as conversas para Dezembro, mais ou menos, pelo menos, até ter oportunidade de se recompor, Vossa Majestade. A descoberta da probabilidade da irmãzinha, num grupo tão baixo da sociedade de Sua Alteza como este, é certamente um profundo choque para ela. E para todos nós, evidentemente.
Ouviu-se na sala um murmúrio de concordância a esta observação, e a Serpente de Fogo pareceu recuperado o controlo de si mesma. Corando um pouco e esboçando um sorriso, um tanto envergonhada, torceu-se e ajeitou o longo rabo-de-cavalo preto, abanando brevemente a cabeça.
- Tem toda a razão, General B. – murmurou ela. – Um choque terrível.
Virou-se novamente para o seu “queridíssimo público” e povo, e, já com as câmaras ligadas, retomou o discurso, mais calma, mas ainda com algumas lágrimas a estragar o seu rímel.
- Tenho que apresentar as minhas sinceras desculpas, meu querido povo. Não só pelo falhanço que foi esta gala, como também pelas coisas horríveis que vos fiz passar, mas...tudo isso é passado.
Dizendo isto, lançou um carinhoso beijo para o seu “querido povo” e acrescentou:
- Começaremos, tal como mandam as tradições e leis de meu pai, uma nova Atlântida, uma....Atlântida livre. Ainda bem que este dia acabou, que eu... Graças a Deus não sofri qualquer dano colateral e....vamos dormir, porque eu tenho o meu pezinho todo torcido...
Com isto, deu meia volta e andou solenemente para fora da sala, acompanhada de várias das suas damas de companhia a coxear e grunhir coisas como «Porquê?!» ou «Só a mim, só a mim!» ou até mesmo «Maldita a hora em que eu concordei beneficiar esta ideia estapafúrdia!»

terça-feira, 1 de julho de 2008

A Festa do "General B" (Parte V)


A noite já ia longa, e quando os fogos fátuos dos ponteiros do gigante relógio de pêndulo de dez metros de altura soaram as horas, todos estavam muito cansados, soltando gargalhadas de satisfação e exaustão, respirando ofegantemente com as roupas todas tiradas, muito felizes por terem caído na esparrela de irem ao melhor sítio de toda a Atlântida festejar o Dia das Magias Negras.
Nesse preciso momento, fosse lá quem fosse, o bizarro anfitrião chegou mais uma vez ao palco para apresentar uma música final que fechasse em grande essa gala.
Quando ele subiu ao palco, todos bateram palmas e assobiaram contentes, alguns talvez bêbados daquela festa de arromba.
Com uma compostura e frieza impressionante, o obscuro homem fez com um requinte inigualável um sinal com as mãos para que todos os convidados sossegassem.
E, ajeitando com delicadeza a camisola de lã negra, comentou num sorriso hipócrita:
- Meine Dämen und Herren, damas e cavalheiros: é quase meia-noite, assim sendo, estão a apenas uma hora e quarenta e sete minutos de perderem os vossos copos de champanhe que eu tão generosamente vos ofereci no início deste agradável serão...!
Mas, como muito bem disse uma vez um inglês: “Isto não é o princípio do Fim, é apenas o fim do príncipio!”
Várias gargalhadas percorreram pelo salão refinadamente decorado da maior parte de serviços, que ecoaram por todas as paredes.
Mal o dedo indicador do anfitrião “mistério” se ergueu, o silêncio pairou outra vez naquela sala, assim, o “General B mascarado” pode continuar o seu discurso:
- Em primeiro lugar, gostaria de agradecer em nome da nossa querida rainha, que autorizou que este maravilhosa...como direi...? Pérola da minha mente se tornasse realidade, e em segundo....
Subitamente, um estranho barulhinho vibrador ecoou pelas paredes da sala onde estávamos reunidos.
Quanto mais o tempo avançava, mais aquele som de nada ia-se tornando mais insuportável e distinguível, um toque polifónico da famosíssima 5ª Sinfonia de Beethoven era o nome dessa música.
Meio embaraçado, mas mantendo a compostura calma sólida de soldado, ele tossiu levemente, e apalpava com extrema cautela os bolsos, como se procurasse alguma coisa.
A maior parte das pessoas tentava em vão conter os risos perante uma cena tão ridícula e humilhante. Até eu não resistir em dar umas quantas gargalhadas à custa daquele quem toda a gente tinha alguns pesadelos pessoais. O General B é uma das figuras mais obscuras e temidas de toda a Atlântida, por isso é que a maioria desatava a rir-se naquele momento.
De todas as partes da festa, esta estava a ser, sem sombra de dúvida, a mais divertida de todas. Até podia imaginar que era o meu padrasto em lugar do General B a ter problemas na oratória.
Passados alguns segundos, já o nosso amado anfitrião estava a atender o seu telemóvel preto 3g da Motorola.
Com um ar natural, e rindo-se da sua própria figura, a olhar para cima como se imaginasse uma desculpa e com a ponta da bota direita a rodar no sentido dos ponteiros do relógio de forma indiscreta, juntou as mãos magras cobertas pelas luvas à cintura.
- Não é uma coincidência, damas e cavalheiros! – Improvisou num tom falso. – Esqueci-me completamente de desligar o telemóvel precisamente antes da gala. Um errozinho técnico compreensível, é claro. Eine moment, Dämen und Herren, esperem só um momento, que eu volto já.
Acenando para a Serpente de Fogo, ele acrescentou:
- Entretanto, fiquem com a deliciosa; a glamourosa; a elegantíssima; a talentosa; sensual; (Já para não falar que ela é uma brasa) a nossa rainha preferida, que nos honra com a sua presença, aliás, acrescento, com a sua divinal presença. Ela será a futura Frau Von Tifon, o como e o porquê será revelado no Baile de Natal do PR. Meus senhores e minhas senhoras: uma salva de palmas para Sua Majestade, a Rainha da Atlântida a cantar "Adeus, meu amor" da Deusa do Caos, Eris.
Sua Divindade ia entrar na sua gloriosa apoteose, andando elegantemente até ao palco improvisado para se cantar, até que...Caiu a última gota!
Ou melhor dizendo, o salto-alto da Serpente de Fogo era tão alto que partiu-se, e a nossa infeliz rainha desceu literalmente do seu pedestal. Melhor, torceu o pé, causando um enorme escândalo, não só diante de todos os convidados, como também diante dos milhões de seres mágicos na Atlântida que a viam através do Canal Nacional, o único canal oficial e legal atlante, já que todos os outros, ou são estrangeiros, ou são por cabo, ou são ilegais e clandestinos, transmitidos pelos Cyborgs. Sua Majestade bem tentava levantar-se, mas era em vão aqueles esforços, carregados de raiva incontida e ataques de histerismo inacreditáveis. Barraca do ano, se fosse a ela eu já estaria no cantinho mais fundo dos buraquinhos. Cinco dos seus homens brutos, logo que ouviram os gritos mimados e inconfundíveis da sua rainha, correram a socorrê-la, muito preocupados, mas com um sorriso sádico nas caras, com as armas empunhadas nas mãos quais nazis empenhados a matar judeus, a pensar se não tinha havido uma tentativa de atentado contra a vida da nossa amada rainha por parte dos Cyborgs. Abrindo as portas de rompante, gritaram em conjunto:
- ALTO LÁ! Vossa Majestade, que se passa?
A mulher odiosa, a chorar lágrimas de crocodilo por todos os cantos e a gesticular-se no chão como uma criança de seis aninhos, a bater com as unhas no mármore do chão, só respondia:
- SEUS IDIOTAS! Não vêem que estou a sofrer a sério?! Estúpidos, vão CHAMAR a ambulância antes que eu vos estrangule esses PESCOÇOS MALDITOS!
O primo nem podia acreditar no que lhe estava a acontecer, e abanava várias vezes a cabeça, tentando não olhar para a enorme peixarada que a sua amada estava a fazer, numa noite tão solene e importante como aquela.
Ele não queria perder a cabeça, oh! Como eu o entendo. Deve ser difícil ter um equivalente feminino do Hitler como companheira de cama... Estou a ser muito mazinha, e na verdade, para além do General B, eu era a única que esboçava um sorriso calmo, obviamente satisfeita por ver a minha pior inimiga a ser humilhada diante de milhões de pessoas. Contudo, havia uma grande diferença entre mim e aquele homem. À medida que a via a sofrer cada vez mais, o meu sorriso deu lugar a um olhar de dó e pena, enquanto que o frio bruxo continuava a esboçar aquele sorriso, aquele sorriso tão cínico, por detrás de tudo e todos, como se estivesse no bastidores. Intuitivamente, consegui ler-lhe os pensamentos.
Comparado com desastre do telemóvel, aquilo era uma calamidade!
Lentamente, afastou-se da sala, e, silenciosamente qual um animal predador que já conseguiu obter a sua presa, sem que ninguém desse por isso, evaporou-se, tal e qual como fumo...!

domingo, 22 de junho de 2008

A Festa do "General B" (Parte IV)

Voltando ao Presente, mal a música parou, o General B tirou sofisticadamente a sua máscara negra enquanto as câmaras e toda a gente olhava para outro lado, e acenou com um sorriso para que eu tirasse a minha.
Eu tirei as minhas pinturas todas, incluindo o batom, e, ao olhar para ele, reparei que estava tudo escuro e não consegui ver o seu rosto, que desilusão!
Só os seus olhos azuis-claros e penetrante brilhavam para mim naquele escuro ardente.
- Não faz mal, minha querida. – Disse o feiticeiro enigmaticamente. – Eu também fiquei com os nervos em franja quando descobri toda a verdade...
Empurrei a pessoa com grande bravura, a pensar se aquilo não era outra máscara.
Naqueles dias, eu mal sabia no terrível pesadelo que me viria a meter...! Era ingénua e jovem, achava que tudo podia se resolver com um estalar de dedos.
- Porque é que o senhor se faz passar por algo que não é? Diga-me lá! – Perguntei num tom desafio. – Eu tinha o pressentimento que só uma pessoa tão malvada e desumana poderia se esconder por detrás do brilho colorido da corrupção que há em toda a Cyborg Town, mas nunca pensei que essa pessoa fosse tão...Humana.
Ele sorriu misteriosamente e fumou mais um pouco da hortelã-pimenta, atirando o fumo azul para mim.
- Talvez a menina esteja enganada. – Insinuo o homem desconhecido. – Você própria o disse: comigo, as coisas nunca são o que parecem....
Aquele mortal desagradável agarrou em mim e tentou aproximar os meus lábios dos dele.
- De qualquer maneira, terá de me beijar, quer queira, quer não. – Comentou num tom divertido. – É que, de uma forma ou de outra, irá descobrir o que eu sou na realidade, mas não hoje.
- Sabe qual é a coisa que eu mais detesto do que pessoas falsas e arrogantes? – Perguntei irritada. – Detesto mistérios em suspenso, fazem-me vir ao de cima a fera que há em mim.
Já ia acrescentar mais algumas coisas, quando, subitamente, as luzes voltaram e toda a gente começou a abrir as garrafas de champanhe, todos felizes, por aquela parte importante da noite se ter cumprido, e mal me virei para o anfitrião, dei-me comigo própria fora do palco improvisado.
Todos – excepto o General B – tinham tirado as máscaras, e, logo todos desataram às gargalhadas, olhando para mim como se eu fosse a palhacinha de serviço.
Tenho de te dizer que a reputação dos Bruxos não é a melhor, somos tomados como hipócritas; ricos; perigosos; perversos; loucos; diabólicos; …Tudo o que tenha a ver com o Demo! Isso é só um rumor espalhado pela própria louca que há neste país. Aquela desvairada da Serpente de Fogo que deveria ir para um hospício, no entanto, tenho pena da pobre mulher. Afinal, que raio de bruxo lhe estará a fazer tanto mal…? Com certeza não será o meu primo. Ele seria incapaz de cometer tal barbaridade. À medida que cantava a sua melodia fervorosa com uma frenética quase prodigiosa e infernal, o seu corpo deixava-se ser dominado pelos avanços do meu primo, beijando-a, só para a ter como forma de distracção sem pudor algum do que estavam a fazer, porém, a sinceridade e ingenuidade com que os seus olhos o olhavam, era amor verdadeiro, e, em toda a sua embriaguez, chorava por estar a mentir ao seu amor. Ela sabia que o amava, e o dramático da situação é que parecia que outro homem tinha-a acorrentado a outras correntes. Eu sabia disso, porque via-se logo que ela mentia tão mal… Ela só se enchia de haxixe e ópio misturados, o ar de embriagada, enquanto embalada na música sonhando com loucuras de juventude, loucuras de amor, trocava de acompanhante de dança da mesma rapidez que acabava cada cigarro. O remix do Michael Jackson com Jamiroquai e Justin Timberlake até nem estava mal. A festa estava mesmo animada, todos os bruxos e bruxas andavam meio malucos com o álcool, o cheiro a hortelã-pimenta, que a Serpente de Fogo não parava constantemente de fumar. Bebiam, beijavam-se com os copos nas mãos, juntando os lábios numa intensidade que nem te conto, abraçados uns aos outros, e batendo palmas, executavam a dança típica atlante, de mãos dadas, com as taças de champanhe nas cabeças de homens, essas malucas, que estavam quase para desmaiar, com os beijos e atitudes desavergonhadas dos seus maridos mais velhos, sorrindo muito divertidos, numa colecção de expressões cúmplices e de camaradagem entre os homens e risadas típicas de bruxas da parte das mulheres, batendo os saltos altos o mais alto que pudessem, dançando cada vez mais rápido, e com os seus echarpes de seda, fazendo movimentos alusivos para os homens, que batiam palmas sentados nos inúmeros sofás que haviam na sala enorme ao ritmo da melodia exótica, cada um com o mesmo olhar amendoado e aparvalhado, apontando as suas mãos a suar de tanto calor e tentação provocados pelas ligeiras e magras mulheres com curvas, balançando como serpentes loucas, com os olhos postos nas suas concubinas preferidas, deixando-se serem molhados pelo champanhe dourado, vermelho, e verde-escuro, abrindo as bocas quais piranhas impacientes para obterem a sua carne desejada, banhada em sangue, ou seja, em álcool. Apesar disso tudo, não consegui encontrar um par perfeito para mim, e não dancei a noite toda como tinha imaginado, com o tal oficial tenebroso e sinistro vestido de preto, com risco ao lado e cabelo cheio de brilhantina, não, não aconteceu isso. Mas se foi uma festa engraçada, foi sim senhor, pois a Tsuna e a Sara dançaram a noite toda, e se elas ficaram felizes, eu também ficaria feliz por elas. Confesso que abanei o capacete, com o Pedro, ai…Que cyborg tão pateta e engraçado, ele é um dançarino excelente, cheio de genica para dar e vender, na pista de dança principalmente! Sim senhor, que maravilhosa noite de gala foi aquela, muito maluca, mas mesmo assim, uma noite de gala, que durou desde a seis até às dez da noite, a provar a gastronomia atlante nada apetitosa, a dançar, foi giro. Bom, … encontrei alguém. Um bruxo reparou que eu estava sozinha, sem nenhum par, e foi-se logo atirar. Andou cautelosamente até ao sofá onde eu estava sentada – o mais cauteloso que se pode estar quando se bebeu dois litros de álcool e se inalou três maços de hortelã-pimenta num só dia!
Com o copo de champanhe na mão direita e agarrando a minha mão esquerda de uma forma apressada no meio da música a altos berros, desta vez uma de metal (ouve um ano em que era doida por essa porcaria), queimando-me com o fogo azul-escuro da cigarrilha na esquerda, e sussurrou no meu ouvido:
- Querida, não quer comer nem dançar? O ambiente está tão…quentinho.
Olhei-o de frente, e levantei-me para vê-lo bem, o seu aspecto era sinistro: alto, de um metro e setenta e oito, com as botas de cabedal a ressoarem desajeitadamente no salão, com a mesma gabardina preta, desta vez de pele de urso espesso e fofo para proteger do frio terrível de Novembro, logo vi que aquele bruxo inquietante e convencido tinha de estar por aqui. O mesmo bruxo que tinha ficado uma noite como nosso hóspede e informador do meu Padrasto. Não sei o nome dele, mas pelos vistos, este também estava a usar uma máscara, mas esta era de bronze.
- Se quer mesmo ficar com um bronze elegante e atraente, pode ir para o microondas, não fará mal nenhum a tostar os poucos miolos que ainda tem. – Comentei entre dentes num tom sarcástico.
Afinal, que bruxo que se preze não vai a uma festa do Dia da Magia Negra…? Que eu saiba nenhum. Mesmo antes de o ter visto já tinha cheirado a sua inquietante presença, e a marca inconfundível do seu cigarro de hortelã-pimenta, que, por acaso não é o Encanto, mas sim uma marca barata qualquer que leva mais pimenta do que hortelã. Os seus lábios estavam manchados com uma tinta vermelha misturado com um líquido prateado qualquer, para mim parecia energia mágica de uma vítima qualquer, provavelmente de uma fada, e sem a luva direita via-se uma pálida e magra mão esquelética a sair da gabar dine. Ao retirar a sua luva negra da minha mão delicada, vi que tinha deixado uma marca com números atlantes e dizia as horas em contagem decrescente para a meia-noite marcavam três horas em fogo-fátuo. Coincidência ou maldição…? Eu apostava na maldição. Aquilo não cheirava nada bem, tal como a cigarrilha do “bruxo sorridente” com aqueles lábios secos e pequenos a segurarem no pau negro de madeira apontado aos meus seios (De novo).
- Vá lá, não me faça uma desfeita destas, Menina Jessica! – Disse agarrando-me na mão e empurrando-me para a pista de dança num tom suplicante. – Gostava tanto que dançasse para mim…
Que queria ele…? Será que não tinha percebido que eu não queria nada com ele…?! Os homens são tão estúpidos!
Ai valha-me Deus! Detesto homens melgas. Detesto, portanto era melhor ele pôr-se na alheta, senão ia levar umas poucas e boas que jamais esqueceria! Isso posso garantir-te.
Ao começar a primeira melodia uma escandalosa música árabe, onde todas as mulheres tinham de sucumbir à sedução pura e erótica dos homens, ele pegou nos meus braços, e, com uma força espantosa, descalçou a outra luva com um sorriso perverso, atirou-a para uma gueixa, uma bruxa japonesa assustadora que, mal acreditando na sua sorte, lançou um beijo de agradecimento para o admirador. As suas mãos que davam a pensar se eram os restos de um exosesqueleto de uma aranha mostravam o quão velho era, se calhar tinha assistido á extinção dos dinossauros, então, após os primeiros dois minutos da longa canção. Sem pudor algum, ainda com os meus braços apanhados sobre os dele, começou o que parecia ser uma valsa super bizarra, enquanto eu punha a minha cabeça sobre o ombro másculo.
Agora conseguia sentir o cheiro de hortelã-pimenta do seu cigarro, e os seus pequenos olhos enganadores azuis claros brilhavam de satisfação. Certamente que era um espião ou um servo daquele bruxo do meu padrasto.
- O que o seu padrasto não dava para estar no meu lugar. – Comentou ele ao agarrar com as mãos electrizadas (resultados de uma tortura no Limbo dos Espelhos, se calhar) a minha cintura. – Mas agora não pode escapar. Dentro de duas horas e cinquenta e cinco minutos, já estará com as estridentes grilhetas dos espíritos das trevas.
Ao ver os seus dentes pequenos e semelhantes a uma serrilha, apercebi-me que estava a dançar com um louco.
Eu reparei na forma como em vez da sua sombra, um homem de cabeça oval de uniforme militar e com nariz curvo aprovava a nossa dança. O meu padrasto, a Serpente de Fogo e aquele bruxo conspiravam contra mim. O olhar infernal dos seus olhos azuis olhava para mim sem que houvesse outra mulher interessado nele.
Estava a começar a ficar um bocadinho farta das irremediáveis tentativas do maldito bruxo com os seus avanços. Lancei-lhe um olhar de desconfiada, e soltei-me daquelas manápulas horrorosas. Mas não posso mentir que a música estava a começar a ficar mesmo, mesmo suave…Aquela era a altura certa para ele me pregar um beijo, porque devia estar tão embriagada do cheiro calmante de rosas, das bebidas e incenso que nem sequer distinguia um sapo de um pavão, se é que me entendes. Isto se ele tivesse coragem, mas eu nem sequer deixava-o aproximar-se da minha cara.
- O senhor é desprezível! – Disse num tom incriminatório. – Eu quero lá saber do seu patrão, deste ambiente tão escaldante, e da forma como me ia beijar, portanto: chauzinho!

domingo, 8 de junho de 2008

A Festa do "General B" (Parte III)


Após todos ficarem à vontade – o que não durou muito – o “General B” (ou quem quer que fosse) começou a fazer as honras de nos apresentar as criadas e oficiais encarregados de nos “servir” como ele disse.
- Agora, uma grande dose de gargalhadas e para os homens e para as meninas más cá do Departamento de Segurança! – Anunciou num convidativo.
Pelas portas da esquerda, saíram cinco raparigas cyborgs e dez rapazes da classe dos Bruxos. Elas vinham da mesma forma que a que nos tinha recebido e acompanhado até à sala de espera, e absolutamente todas tinham (apesar das suas diferenças de nacionalidades e culturais) na coxa direita uma estrela negra com as iniciais do seu excêntrico “senhor”.
Os bruxos mais importantes dentro do departamento do General B vestiam todos o uniforme oficial da SPV, com blusão vermelho de cabedal e ombros pintados de preto, com um distintivo e botas militares com calças de jeans amarelos-escuros. Admito que o estilista que tinha desenhado aqueles uniformes não tinha lá muito bom gosto.
Tanto os bruxos como as Cyborgs tinham as caras pintadas conforme a sua classe para não se verem os seus traços faciais verdadeiros.
Aquela noite de gala era o Carnaval de Veneza ou quê? Nessa altura, fiquei ciente duma coisa que não tinha reparado: toda a gente estava vestido duma maneira estrambólica e quase cómica. E todos ou usavam máscara, ou tinham a cara pintada para não os reconhecerem na televisão. Era uma sensação completamente assustadora, aquelas mil caras de papel e tinta estarem a olhar para mim, e só nessa altura, vi que a nossa classe leva mesmo a sério a tradição do Dia das Magias Negras de pintarem as caras com as mais variadas cores ou se mascararem com a mais estranha e divertida carantonha possível. Assim, espantei-me de ver por detrás dum bruxo nazi morto-vivo o Pedro a sorrir com um ar galante. Como raio ele tinha entrado aqui?!
Não importava, o que interessava realmente era que podia dançar com ele...Se ao menos me reconhecesse por detrás da fantasia de Eris!
Tentei chamá-lo pelo seu nome várias vezes, mas o som ensurdecedor dos altifalantes e da voz horrível de cana rachada do General B abafava os meus gritos vãos, e, assim, empurrada pela multidão de caretas, saltimbancos e outras coisas fantásticas, perdi-o naquele mar de luxúria e inúmeras loucuras.....Para ser empurrada precisamente para o palco onde o nosso honrado anfitrião iria apresentar a primeira canção da noite.
Depois de terem soado o rufo das caixas de rufo da orquestra composta por Fadas, o General B sorriu para todos os convidados, com um ar de estar a se divertir muito.
Deu um valente sopro do seu cigarro elegantemente, e, olhando-os, falou num tom insinuo:
- Meine Dämen und Herren, minhas senhoras e meus senhores: chega a altura de cada ano nesta véspera em que se tem de retomar a antiga tradição de sacrificar a nossa formosa Eris para as chamas da paixão do louco amor.....Para mais uma vez, comermos a sua carne e derrotarmos o terrível espectro de Samiel, o grande Rei dos Bruxos, para assim, termos um “ano bruxal” cheio de paz e boa energia a rodear as nossas casas.
«Assim sendo, quem será a corajosa e jovem donzela que se atreve a “despir o seu corpo” diante de toda a Atlântida e ser consumida pelas chamas simbólicas do prazer da música?»
Olhou para todas as mulheres presentes naquela sala, mas nenhuma teve a ousadia de subir as escadas para vir cantar o trágico dueto entre Samiel – o General B em pessoa ia fazer do Assassino do Amor – e entre Eris – uma bruxa qualquer, em que, no final da canção, ambos tiram as máscaras discretamente sem que os outros convidados vejam e beijam-se num longo e delicioso beijo enquanto esta desfalece nos braços do Rei dos Bruxos, “queimada” pela ardente paixão do amor. Esta tradição atlante simboliza a entrada dum novo círculo anual de boa sorte e paz.
Seguiu-se um arrepiante silêncio de cortar à faca, e, automaticamente, todos se voltaram para ver uma rapariga tímida de dezassete anos a tentar escapar ao fatal destino.
Até que, os olhos cinzentos-azulados do General B fixaram os meus, e, nesse momento, a sua voz de xarroco e estranha, soo-me nos ouvidos como um lúgubre sino a anunciar a minha condenação:
- A menina Jessica quer dançar?
Para o meu espanto, escutei a minha própria voz a responder, naturalmente, enquanto pegava na mão ossuda coberta pela luva negra do misterioso oficial:
- Pois não, meu senhor.
Quando a música começou, eu e o “General B” dançámos ao som dum invulgar dueto entre um demónio e bela mulher ruiva, a mais trágica e sinistra de todas as trovi que se possa imaginar!
A sua letra, chegada oralmente até aos nossos dias, é dançada mais ou menos assim:



Livre, sempre livre, nos areais
Andava uma velida garça dourada
Ao cair noite mostrava a sua plumagem
E todos os caçadores ficavam enfeitiçados por tal miragem

Ò velida garça dourada!

Era uma bela criatura alada
Sempre livre, a passear pelas margens do Bênção,
Ave louvada, onde estará o caçador que te irar ferir...?

Ò velida garça dourada

O meu sentinela ei!
Está a me depenar
A depenar-me para em alva
Nas suas brasas de amor me assar

Ò meu corpo fremoso,
É tão mimoso...

Era uma velida e fremosa alminha perdida
Agora já não tens penas para te guardar
Ò pobre e consumida garça dourada...


A princípio, a linguagem é um pouco complicada de compreender, mas depois, percebe-se logo quem é o caçador e a garça.
Este diálogo entre um grupo de caçadores e uma garça lendária de penas de ouro faz referência à antiga fábula da “Garça Dourada”, uma garça muito vaidosa, que ao ser cortejada por um caçador astuto, acredita que vai se deitar com este, quando ele vai na verdade, comê-la. Samiel, com a sua língua viperina, adorava este conto cómico e escarnecido, e aproveitou a fábula para escrever este pequeno poema cantado quase tão famoso na Atlântida quanto o “Parabéns a Você”.
O astuto caçador era Samiel, que se sentia satisfeito por ter matado Eris, ou melhor, a “depenado”.

Nos braços fortes do General B, senti o calor que me vinha à cabeça , e o porquê de que se diz que quando um bruxo e uma bruxa se tocam, o calor dos seus corpos é mais abrasador que uma fornalha a mil graus centígrados. Tal como nós – os Bruxos – somos muito fortes no campo de batalha, o sexo e o amor é, para nós, uma coisa sagrada. Havia algo naquele homem de inquietante, «…este homem tem o poder de se tornar muito perigoso…» pensei cá para os meus botões. Ao encostar-me ao tronco forte coberto pelo casaco preto do general, quase que estremeci, que feiticeiro poderoso, e, à medida que os nossos corpos dançavam ao som dum estranho tango com oboés oscilantes e acordeões e violinos sensuais, quase que poderia jurar que estava presa por fios, os quais só o general poderia controlar!... O meu peito espevitou-se de repente, e, em instantes, já não me interessavam os outros convidados, que igualmente dançavam ao som da música tentadora e voluptuosa. Estava num estado de êxtase tal, que até corei, de tão perto que o meu corpo estava entrelaçado ao do feiticeiro mais velho. Quem me dera saber o que é que estava por detrás da máscara de porcelana preta que o enigmático General B usava…