segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Os "Guarda Costas" (Parte Final)

Lá em baixo, é tudo construído em pedra fria, incluindo os pilares que seguram as galerias de oito metros de altura.
Toda a gente pensa que, se seguirmos sem sabermos o caminho, iremos ter às ditas passagens secretas. É claro que, como eu ia escoltada pelo Fritz e o Skánvasse, dois polícias da SPV contratados pelo primo para serem os seus guarda-costas.
Aqueles dois não são polícias, são mas é dois criminosos gigantes acéfalos de uniforme, foram eles quem tinham me acordado e dado um banho de água fria com um balde que tinham achado pelo caminho do meu quarto na enorme sala de arrecadação. O primo mantém estes assassinos ao seu serviço, uma vez que são tão burros, que nem duas portas diante da outra. As ruas deste labirinto são como o interior dum enigma incapaz de se resolver: curvas, contracurvas, galerias, estalactites e estalagmites por debaixo e por cima de tectos e pisos quase macabros, com restos mortais de prisioneiros dos nossos tirânicos antepassados! Foi aí que me apercebi dos rumores de que o Château Von Tifon tinha sido construído sob uma incrível quantidade de cavernas e labirínticas grutas subterrâneas era verdade. Apenas o primo conhece 50% de todas as passagens secretas escondidas no interior do Château que dão acesso a estes escuros túneis com cem metros de profundidade, e é quase impossível vê-las a todas na sua totalidade numa só semana.
E eu que pensava que os bruxos eram espertos, mas afinal, há excepções. Podia muito bem escapar, mas o que se seguiria depois da minha captura não recompensava aquela atitude ousada.
Debaixo do disfarce de simples ex. Combatente alemão e grande diplomata no Palácio das Reuniões entre Cyborgs e Bruxos, o Primo Coutinho – como tão carinhosamente a família o trata – faz uns negócios sujos aqui e ali com os Demónios. É claro que o primo jamais seria um corrupto. Mas ele precisa desse tipo de “diplomacia” para assegurar que a Serpente de Fogo e os da SPV não suspeitem de nada acerca do verdadeiro propósito misterioso que os Von Tifon construíram esta mansão.
O palácio luxuoso e as masmorras são a verdadeira prova da dupla personalidade dele, umas vezes simpático, outras extremamente severo!
O caminho era iluminado várias vezes por tochas, mas nem isso evitava as minhas mãos de congelarem. O andar das conversas é um autêntico frigorífico. Ao descer as podres escadas em caracol cheias de bolor, tentava contemplar a enorme maravilha arquitectónica que eram as galerias debaixo do Château.
Ao chegarmos à porta, as duas bestas empurraram-me lá para o escuro escritório do primo.
Dum aspecto quase tétrico e demasiado clássico para o meu gosto, o escritório do primo era uma sala pequena e sem janelas.
Dois candeeiros pousados na mesa de carvalho iluminavam com facilidade duas aves empalhadas, uma águia que segurava nas garras uma caneta, enquanto uma coruja fazia de bibelot para uns quantos livros.
Sob a cabeça redonda do primo, estava um retracto sinistro do primeiro Von Tifon, enquanto que vigiava uma estante de alabastro. À direita, numa pequena mesa de café esculpida com três patas de leão, havia um telefone fixo moderno.
E, sentado num enorme cadeirão vertical, estava o próprio primo com o seu bigode bávaro e olhar altivo de cristal.
Não que o primo tenha um aspecto intimidante, não senhor! Antes de o conhecermos, até parece ser uma boa pessoa.
Mas, pelos vistos, hoje não estava de bom humor.
Ao seu lado, com as mãos envernizadas e unhas compridas a massajar carinhosamente as costas, estava a Serpente de Fogo em pessoa, debruçada sobre o corpo másculo do duque, com uns brincos de pérola a cair sobre as orelhas redondas e entre o cabelo longo preto, esboçava um sorriso escarninho e quase para o trocista.
Vestia um top de seda lilás, e, nas pernas sedosas e escorregadias, pousadas no colo dos calções azuis do primo de dormir, vestia umas corsárias curtas, prova que iria também dormir aqui em casa.
Enquanto o primo, apenas duma camisola branca interior e daqueles calções desportivos, com uns chinelos pretos calçados e o roupão escarlate desleixado de linho e empoeirado, ostentava nas faces um ar descontente.
- Senta-te, Jessica! – Ordenou num tom autoritário. – Querria falarr um pouco contigo.
De forma alguma recusei, e sentei-me no pequeno banco de plástico, mesmo em frente do primo, que nem parecia o mesmo. Ò Diabo...Quando ele fica assim, significa que vai haver sermão dos grandes.
O número infinito de palavras rudes incluíam vocabulário alemão e outras coisas feias como “cyborg inferior” e “uma jovenzinha não tem o dirreito de ir nesse aparrato com um...um...imundo qualquer, nascido sabe Deus onde!” ou ainda “impuro”.
Parecia um daqueles discursos idiotas de que os Bruxos são superiores aos Cyborgs na pirâmide de classes.
O problema é que a maior parte dos Bruxos levam isso tão à letra como se fosse a doutrina nazi contra os Judeus.
É por isso que não gosto nada do primo com as suas manias das “raízes germânicas”, “tradições saxónicas”, “superioridade da magia negra”, “elite bruxal” e outras tretas preconceituosas.
Ainda tentei balbuciar algo como “foi só desta vez” e “ele não tem culpa nenhuma do primo andar assim tão maldisposto”, mas foi logo interrompido por mais uma série de palavras incompreensíveis e demasiado caras como “inadmissível” ou “estamos numa casa séria, minha menina!” ou até mesmo “aquele boémio está a desencaminhar-te”.
As palavras iam-se desenrolando, uma a outra, até chegar à síntese das sínteses, algo como “eu só quero o teu bem, priminha” e ainda mais “nada de poucas verrgonhas, estamos entendidos?”.
O meu primo também tem a mania das grandezas e parecia que estava a utlizar demasiado vocabulário para uma só saída.
Enfim, terminou a longa serenata com apenas duas frases.
- Já terminei! Tens alguma coisa a dizer em tua defesa, minha menina?
- Sim, querido primo! – Respondi suavemente e com a voz distante. – Sinto muito...Tschüss.
Dito isto, virei a ele e à Serpente de Fogo – que, a partir de agora, vive connosco – costas e comecei a cantarolar, pela escadas do Château acima, a rir-me de coisa nenhuma como se fosse uma criancinha de cinco anos.
Quando as minhas pernas graciosas nem se viam, a Serpente abanou a cabeça, com um ar muito vazio e chocado.
- Bebé, a Jessicazinha está doente...
Ele acenou afirmativamente com a cabeça, igualmente preocupado.
- Mas que bicho lhe mordeu? – Exclamou curioso.
A Tsuna, mais romântica do que eu, interpelou-se(??) entre aqueles dois e sorriu com um ar sábio e, pondo a cabeça nos ombros, os seus olhos brilharam de ternura e compreensão.
- Não é óbvio, Priminho? A Jessica está apaixonada por alguém...!