sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Como eu (Jessica von Tifon) fui concebida

13-2-2005

Já imaginaram o que sentiriam quando descobrem que engravidaram a mulher mais malvada e que odeia crianças a pontos de as ver em espetadas em azeite? Bem, o meu pai sentiu isso mesmo, no pobre coração de feiticeiro checo, acabado de sair do Holocausto. Depois da guerra, em 1955… Sim, o meu pai era eslavo e então?

Vão dizer que os meus caracóis cor de carvalho vermelho e esta penca horrorosa são marcas indubitáveis da minha imundície? Pelo menos é isso o que a minha mãe não para de papaguear durante todos os almoços e jantares e pequenos-almoços.

Agora que conheço quem é que é a minha verdadeira mãe, tenho pena do meu pai, quando ele descobriu uma desgraça daquelas. Thomas Migntetiyte, da rica família dos Migntetiyte, primo afastado do grande checo Drahómir Migntetiyte.

Curiosamente parece que a única pessoa que não se importa com isso é o meu padrasto. Heydrich tem sido bastante simpático para comigo, nos últimos dias.

Mas falemos mais sobre essa história tão curiosa:

O meu pai tinha acabado de chegar de uma grande festa em honra ao facto de que o meu padrasto tinha sido descoberto e fechado no seu caixão de gelo. A verdade é que quando a maior parte dos judeus que viviam escondidos em Losjafhden durante aqueles anos todos (escondidos da Guerra e dos Nazis), quando eles descobriram que a razão que os tinha levado a atravessar um continente tinha recebido o castigo merecido, eles acordaram com os “grandes salvadores do Exército Vermelho” para fazer uma grande festa.

Foi um momento raro entre feiticeiros brancos judeus, checos, polacos e bruxos russos. Acontece que durante a festa, entre as danças, entre a galhofada, entre a alegre música tocada pelo famoso guarda ucraniano que tinha lutado contra Heydrich em pessoa, o Igor Andrysiak, houve uma grande distribuição de vodka, Frambinam e schnapps.

Igor – o tal distinto tocador de balalaica – ofereceu-se para fazer desatar a gargalhada em toda a gente e fazer uma cena de strip tease, enquanto imitava a voz falsete de Heydrich!

A festa chegou a ser tão incomodativa que até os muçulmanos que viviam na região decidiram juntar-se à ocasião. Volta e meia, eram chineses, eram italianos, eram japoneses, eram demónios, eram humanos, todo o tipo de macho que se prezasse em Cyborg Town começou por cantar, beber, e tocar instrumentos e dançar!

Até os verdadeiros bellantes, os que eram da descendência dos Astecas, decidiram entrar na pequena taverna que agora estava apinhada de gente.

Ninguém queria que um Nazi fosse o próximo Rei dos Bruxos, o governante do Norte e de toda a Cyborg Town.

Por isso, num momento único de convívio e felicidade, toda a Cyborg Town festejou a queda das forças do Mal.

Quando o meu pai saiu da festa, ele acompanhou uma belíssima senhora de cabelos louros e encaracolados até à saída. Era óbvio que ela estava muito mais bêbada que ele. E claro, vocês sabem muito bem o que acontece quando uma mulher está com a cabeça nas nuvens.

Ela nem o reconheceu. Nem ele a ela.

A maneira como Heydrich – sim, foi ele que me contou essa história, e não digas que é mentira, porque eu desta vez sei muito bem quem é a minha mãe. Mulher inocente e honesta uma ova!

Na hora em que ambos saíram da humilde taverna, já era meia-noite. Uma bela lua cheia parecia pintar o céu de dourado.

A minha mãe, uma mulher tentadora, quase que parecia a concubina do diabo, com aquele vestido azul-escuro que abria um grande decote em forma de V nos seus seios rechonchudos e rosados.

Com o cabelo desprendido de qualquer tipo de amarras ou arames, ela beijou, como se fosse uma sanguessuga, a boca do pobre Thomas Migntetiyte

- Seria uma pena não aproveitarmos esta noite tão bonita…! – Sussurrou numa voz quase rouca e que ela pensava ser sensual, ao passear os dedos longos e afiados sobre o tronco forte e cicatrizado do meu pai.

Com um chapeuzinho preto na testa – como se estivesse de luto – ela penteou com a outra mão, os cabelos em forma de espiral.

Ela deslizava como uma cobra, acompanhando os “passos de dança” do seu bêbado parceiro na pista que era a desgastada Travessa da Bruxa Vermelha. Agarrando na cintura como se fosse uma prostituta, ela despiu (despiu não é o termo mais correcto, mais rasgou!), naquele exacto momento as cuecas pretas com lacinhos cor-de-rosa.

Mostrando aquilo que qualquer homem quereria num momento como aquele, Katharina von Tifon abanou, como uma leoa, a sua enorme juba loura de cabelo.

- Viola-me, seu grandessíssimo comunista de merda! – Respondeu ela, em voz alta. Se o agente secreto do KGB, Thomas Mignetyte estivesse com o juízo todo na cabecinha, talvez não tivesse reparado no enorme rasgão que existia no vestido, a mostrar as pernas nuas e reluzentes, como se fossem entrecostos de frango.

Se ele estivesse com os parafusos todos no lugar, ele talvez tivesse reparado que aquela mulher tinha sido ajudante de um dos homens mais maquiavélicos que existiram à face da terra.

Mas aquela festa tinha sido mais doida do que o Dia das Bruxas. E como se diz lá naquelas zonas nortenhas de Cyborg Town: “foi só mais uma noite no Red Witch!”

Thomas Migntetiyte era um jovem demónio e um bruxo, aquilo que, nos países de leste se chama um vampiro! Os seus instintos da sua espécie, classe, e sexo já não se conseguiam controlar. Talvez seja por isso que eu tenho estes dentes horrorosos e fico sempre com olhos vermelhos nas fotografias.

Rasgando igualmente a sua capa de couro negra, ele atirou-se a ela como se fosse um lobo esfaimado.

Tirou as botas, à medida que a beijava violentamente! Ela respondia com igual competência, à medida que trocavam palavrões nas suas línguas.

«Maldita bruxa de uma puta nazi, eu odeio-te!»

Mas o ódio também é um sentimento. Ele forçou-a a ficar com a cara numa fonte, a água a encher-se de sangue. Embriagado com o álcool e com o sangue, ele agarrou-a pelos cabelos e prendeu-a com a cinta.

A pobre da minha mãe – que, pelos gritos histéricos de “mais, mais! És um grande maricas, não consegues fornicar a sério?!” estava e pelos risos loucos que saíam da boca dela, o cabelo molhado em sangue, as traseiras ensanguentadas, estava a divertir-se imenso!

Depois de chegar a um verdadeiro estado de orgasmo, a minha mãe, completamente imune às mordidelas do meu pai no pescoço, era quase irreconhecível.

O meu pai, satisfeito com o facto de ter tido uma grande noite – sem saber muito bem, ou talvez sabia – deitou-se ao pé dela, ao observar as estrelas, e levou-a para a casa dele.

A minha mãe estava estafada – mesmo para ela, aquilo tinha sido um grande esforço – e o meu pai, sonhando com o facto de, na próxima noite, a ver furiosa, aos gritos, a espernear, esboçou um leve sorriso malicioso.

É preciso dizer que o meu pai era um feiticeiro jovem nessa altura, gostava de pregar as suas maldadezinhas de vez em quando. E irritar uma bruxa nazi era um prazer para ele, tal como beber vinho do porto é um deleite para mim.

Com uma força espantosa, ele carregou-a ao colo e levou-a até ao Château. O meu pai quando a deixou, ali, estendida no sofá do átrio, ficou um pouco remorsos. Aquela tinha sido uma acção vergonhosa.

Mas o que tinha sido mais humilhante era ter sido como um escravo às ordens de um simples humano durante um ano inteiro!

Era a sua espécie de vingançazinha contra Heydrich e contra as coisas que ele tinha feito ao país que Thomas Migntetiyte considerava como a sua pátria: a República Checa.

A minha mãe, quando acordou, ali, deitada, como se fosse uma vagabunda, teve um mau pressentimento.

A minha família nem perguntou nada. Eles já sabiam como é que ela era. E, naquele momento, pouco restava da nossa família e que não estivesse na prisão: só Charlotte, Couto e Nälden a olhavam, um pouco desconfiados.

Contudo, havia um estranho sorriso no rosto da mulher, ao se acarinhar no sofá. Sonhando com o tímido, doce e apaixonado Reini, havia lágrimas nos olhos dela. Lágrimas de felicidade.

Parecia que se estava a despedir dele. Ele, que durante anos e anos, tinha sido o objecto da sua paixão, agora…Apenas o queria como um amigo! Mas agora, tinha de esperar mais cinquenta anos.

A verdade é que a minha mãe tinha tido o sexo da sua vida. Deixem-me ver… É, sim, ela teve a noite de sexo da vida dela.