segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Um bruxo do Norte (Parte I)

As orelhas de um bruxo são espetadas, parecidas com as de um morcego, mas que não se notam nada nos chapéus que usam. O Tenente com Luvas Púrpura tinha um pouco do seu cabelo louro, penteado para trás, com brilhantina, que mais parecia uma tocha, e uns olhos verdes, como se fossem os de um réptil, que brilhavam intensamente, com um sorriso fácil por detrás dos dentes incisivos escondidos por detrás do céu da boca. E no entanto, conseguia-os esconder tão bem que qualquer miúda, se o visse passar sem uniforme, o tomaria por um rapaz modelo ou pelo um membro de uma famosa boysband, dado a sua linda cara. Mas atenção; aqueles que estiverem a lerem estas cartas! Uma bruxa elegante e simpática ou um feiticeiro sedutor e carinhoso é muito pior que um fantasma ou que o monstro debaixo da vossa cama. Um feiticeiro malvado ou uma bruxa aparenta ser uma pessoa ou um ser humano normal, com hábitos normais, aos nossos. Alguns até são políticos…!

Visto do interior do pátio, o castelo parecia mais pequeno, com cinco alas unidas por cinco torres, posicionadas numa distância quase mística, fazendo, de cima, provavelmente, o desenho do pentágono, uma figura geométrica relacionada com a magia. Na ponta mais a Sul, a torre mais acastelada e larga, com uma arquitectura semelhante a um minarete, ostentava a bandeira da classe dos Bruxos.

O tenente regressou e, para minha surpresa, fez-me a continência, batendo os calcanhares. Suspeitei que isso tinha mais a ver com o que o meu Padrasto ou o assessor lhe tinham dito do que a minha personalidade autoritária.

- Menina Jessica. – Disse ele respeitosamente, na sua voz aguda com um sotaque que parecia ter sido herança de um bisavô demónio (os Bruxos geralmente têm uma voz muito aguda, quase estridente, diga-se por passagem), dando-me um beijo solene nas costas da minha mão esquerda, fazendo uma enorme mesura para se ajoelhar dignamente. – O seu padrasto está a acabar de jantar e pede-lhe que aguarde no átrio que fica na torre oeste. Siga-me, por favor. O cabo tomará conta dos seus haveres pessoais como a carteira.

- Muito obrigada, tenente. – Respondi eu, num tom sarcástico. – Mas primeiro, tenho que tirar alguns documentos importantes que deixei na carteira.

Depois de retocar o batom, pôr o anel favorito da minha mãe e perfumar-me com o “Poison – Snake”, uma fragrância muito forte e provocante da qual o meu Padrasto gostava muito por causa de ser o perfume que a Katharina usava normalmente (e que, só por curiosidade, ainda está no topo das fragrâncias preferidas das Bruxas), segui o tenente através do pátio empedrado em direcção à ala oeste. Algures, no nosso lado esquerdo, ouvia-se o som de homens a cantar, com risos traiçoeiros e voluptuosos de raparigas dos dezasseis até aos dezanove anos.

- Parece ser uma grande festa. – Disse eu friamente. A minha escolta murmurou algo em ucraniano sem muito entusiasmo. Qualquer tipo de festa é melhor do que ficar de guarda à noite, em Outubro. Passámos por uma pesada porta de carvalho e entrámos no grande hall.

Todos os grandes castelos de bruxos deviam seguir este estilo gótico, agitado com um pouco das salas asiáticas, chinesas e hindus, com uma mistura de cores impressionantes.

Todos os guerreiros de Tsesustan deviam viver e pavonear-se num lugar destes, todos os mandões da Magia Negra, seguidores do terrível Samiel, deviam rodear-se assim de numerosos emblemas, espelhos duma impiedosa tirania. Para além dos imponentes tapetes, quadros insípidos de vários notáveis da Magia Negra, os quais provocavam uma sensação diabólica que estávamos a ser vigiados, havia um número suficiente de sabres, adagas, armaduras, germânicas, russas, hindus, nipónicas e chinesas, machados, tridentes, estrelas de cinco pontas e outras demais armas asiáticas, eslavas e nórdicas nas paredes para travar uma guerra com o Rei da Tailândia, e todo o exército siamês.