sábado, 9 de junho de 2007

O acendedor de candeeiros sorridente (Parte II)

Não percebendo nada do que ele estava para aí a falar, soltei uma risada divertida, abanei a cabeça, julgando que ele estivesse a brincar comigo, perguntei num tom baixo, contendo o riso:
- Então, qual criado? Não vejo ninguém a não ser tu!
Encolheu os ombros, a descer do escadote, baixando a cabeça cuidosamente, com o quadro na mãos, não só para não deixar-me vê-lo, com um sorriso entre dentes, tentando cobrir com as suas mãos o valioso quadro tapado com um manto preto. Sem saber o que fazer, pousando a valiosa obra de arte no chão cuidadosamente enquanto ponha um pé de cada vez nas plataformas metálicas do escadote, com o seu rosto a corar um pouco.
Que estaria a esconder de mim? Sabia muito bem que eu era curiosa, portanto, de quem quer que fosse o retracto, este tinha de o pôr num lugar mais seguro do que ali, perto da minha vista. Ele pensou durante uns minutos, parado no meio do escadote, a gaguejar entre si, e, após cinco minutos, juntou as mãos e suspirou “Ah!”, e, se não fosse os seus reflexos, já estaria com a cabeça ou outra zona do corpo desajeitado estragada, apoiando-se entre os armários de madeira decorados castanho-escuros, suspirou de alívio ainda a recuperar do grande susto. Devo dizer-te que a pior coisa que Nälden teme mais do que o regresso dos Nazis são as alturas.
- Pois… foi o prego! – Disse numa voz meio apressada e fina. – Como é que lhe posso explicar-me, menina? O maldito objecto de ferro não deveria segurar o seu amo? Assim, fê-lo cair! Não foi uma desgraça?
Ri-me baixinho, ajudando-o a descer, abanando a cabeça da comédia que o suburdinado do meu primo estava ali a fazer a altas horas da noite, estendendo as minhas unhas longas e pegando-o entre a sua cintura cuidadosamente, como que se fosse um bebé gigante, e a sua cabeça ficou pousada entre o meu peito voluptuoso, rindo-me da figura que estávamos a fazer. Com o amaricado Tenente Otto Nälden é impossível ficarmos melancólicos e trombudos! Há sempre cada situação!
Quando as minhas mãos o pousaram no chão, ele estava mais vermelho do que um tomate, ainda colado às minhas mamas apetitosas para qualquer homem, mas não para o um dos suburdinados mais maricas do Primo Coutinho, a tremer chiando agudamente por dentro qual rato assustado no meu soutien. Eu quase que ia desatar às gargalhadas, se ele não fosse tão meu amigo, acredita que já estaria a fazer chichi de tanto rir, deitada no chão, mas a dignidade está sempre primeiro. É claro, como ele é tão estúpido e burro, aproveitei para gozar com ele, e ao afastar delicadamente a sua cabeça dos meus seios, desapertei o cinto dele, e “trinquei-o” sensualmente, tirando-o suavemente da sua cintura vermelha, por eu espertar-lhe as garras, e, cobrindo provocadoramente a cara com o cinturão de veludo macio, abanei as ancas qual odalisca que dança o “ventre”, sorrindo com um olhar misterioso.
- Sim, o prego foi de facto, um menino muito, muito, muito maroto! – Comentei numa voz aliviada, e com um tom de bebé atiradiça. – Não se esqueça dos quadros dos outros bruxos, meu tenente.
Deixei Nälden completamente de queixo caído, com imenso medo de mim, encolhido durante dez minutos. Era divertido vê-lo tão aterrorizado com o meu comportamento.
Digo-te que não sou nenhuma betinha, ai não senhor! Se pensaste que eu sou qualquer uma que tem um maravilhoso gosto para roupa á toa, estás muito enganada. Para esquecer o facto de nunca ter tido uma verdadeira família e ter medo de homens mais velhos – excepto aqueles em quem confio realmente – escondi esse receio ao conseguir adquirir uma terrível fama de só curtir com rapazes durante uma canção de dança na discoteca e namorar num prazo de três semanas, com resultados espantosos.
Cresci em Londres, e posso ter sido educada por um curador de um museu, goste de História, mas nunca dispensei a beleza, a lata, e o estilo de vida urbano da noite.
De dia, ajudava o meu avô no museu e era a santa das santas, de noite, era a rapariga mais bonita e deliciosa da pista de dança! Não sei aonde herdei esta malícia toda.
Da minha mãe nem do meu pai é que não deve ter sido! LoL
As jovens bruxas por aqui não são praticamente umas tímidas e coitadinhas meninas de escola: saias demasiado apertadas de cores quentes e escuras, ajustando-se às curvas, aneis no anelar estilo góticos, lábios malvados e enganadores pintados de batons ou glosses de todas as cores mais provocadoras o possível, ancas que até se podia pôr a placa “Vem apanhar-me, Assassino do Amor”. Nós, as bruxas, quer sejamos morenas, louras ou ruivas – como é o meu caso, sou ruiva – somos más como as cobras!
Mas o que é que pensas? Que são os bruxos os ricaços? Não senhor! Os homens da nossa classe são todos uns pobretanas artísticos quando são jovens, sem pataque nenhum, a não ser que tenham sangue negro – que é como nós, Bruxos, chamamos de dinheiro, ou energia mágica muito poderosa – na família, eles não têm onde cair mortos e velhos. Nessa altura, aos vinte até aos acima de cem anos, estão em Cyborg Town, a vender pipocas ou castanhas. Agora, ao arranjarem mulher rica, uma bruxa ou uma nobre, o caso muda completamente de figura: já têm dinheirinho para “acolher” os demónios que quiserem como seus servos na Fronteira; fumar os cigarrinhos de hortelâ-pimenta mais caros de toda a Atlântida; as lustrosas limusinas pretas; as mansões e castelos assombrados na Cidade Perdida; receber as visitas das inocentes e sonsas raparigas de quinze até vinte anos; expulsar ou matar mesmo a sua mulher com um açúcarzinho qualquer no chá das cinco; ou abusar do fumo do cigarro e atirá-lo todo para os pulmões da pobre coitada da mulher…Bem! Aí, é que nós dizemos que aquele homem já não é um bruxo, mas sim um Assassino do Amor! Pomos-lhe essa alcunha por causa dos crimes que ele faz. Mas verdadeiro e único Asassino do Amor, só o Euncätzio.
Eu, vendo que já estava a exagerar com a brincadeira sem vergonha nenhuma, esboçei um sorriso amarelo, pondo o cinto no pescoço dele, e fazendo um nó de gravata com ele, a rir-me num tom simpático:
- Vá lá, não fiques assim. Estava só a brincar. Mas…Será que haverá outro bruxo mais alegre e engraçado do que tu? Oh, como o meu coração é diferente do teu, Nälden.
Achei que era bom eu e ele termos uma boa conversa, já que como não estava com sono, e que ele igualmente não lhe apetecia dormir.
Afinal é para isso que servem os amigos: para falar a meio da noite, eh, eh, eh. Quando os males estão a sobrevoar o céu celeste, e quando o Asassino do Amor tem mais poder.
Uma vez, o meu avô disse que se alguma vez o papão me viesse assustar, bastava pedir ajuda ao amigo mais amigo: Jesus. Dizer o seu nome aqui é sinónimo de espanto dos maus espíritos fora. O meu avô também me deu um amuleto antigo para me proteger contra as ameaças dos fantasmas escoseses nos castelos ao chegarmos, quando tinha cinco anos, à Escócia, e só tinha de pronunciar o nome dele, Thomas Magnetite, para me livrar das tentações do Diabo.Tu sabes, é sempre bom ter alguém para nos amparar nas noites dos bombardeamentos ou quando o Assassino do Amor anda por estas zonas à procura de meninas que andem perdidas na rua à noite. Um braço onde nos pudermos agarrar-nos para termos coragem para enfrentarmos os monstros da escuridão. E nessa altura, o maricas, porém valente Nälden era uma luz ao fundo do túnel.
Ainda por cima, com o Primo Coutinho fora, a passar a noite no Anel da Serpente com a sua namorada nova. Não sei quem é ela, mas deve ser uma bruxa muito bonita e com os elevados padrões que o primo tem…

Um comentário:

Anônimo disse...

Como sempre, show de criatividade e pontinhas de humor bem colocadas. Terá continuação? Essa estória já é uma verdadeira saga.
Desculpe ter ficado meio ausente. Mas recuperar os textos de UATI tem sido uma tarefa árdua.